Em depoimento ao STF, ex-comandante da Aeronáutica detalha reuniões com Bolsonaro e revela apoio militar à tentativa de impedir posse de Lula
Em depoimento ao Supremo Tribunal Federal (STF) nesta quarta-feira (21), o ex-comandante da Aeronáutica Carlos de Almeida Baptista Junior reforçou as acusações de que Jair Bolsonaro e aliados articularam medidas para impedir a posse de Luiz Inácio Lula da Silva após as eleições de 2022. O militar detalhou reuniões no Palácio da Alvorada em que foram discutidas ações para evitar a transição de poder, incluindo a possibilidade de decretos de exceção e até a prisão de autoridades.
Baptista Junior confirmou que o então comandante do Exército, Marco Antônio Freire Gomes, ameaçou prender Bolsonaro caso ele insistisse em medidas antidemocráticas. Além disso, citou o ex-comandante da Marinha Almir Garnier Santos, que teria afirmado colocar “14 mil fuzileiros” à disposição do ex-presidente.
“Brainstorming” sobre prisão de Moraes e ministros do STF
Pela primeira vez, o brigadeiro revelou que houve um “brainstorming” (debate de ideias) sobre a detenção ilegal de autoridades, como o ministro Alexandre de Moraes, do STF.
“Isso era um brainstorming nas reuniões. Eu lembro bem, houve a seguinte discussão: ‘Vai prender o Alexandre de Moraes, presidente do TSE? Vai. Amanhã o STF vai dar um habeas corpus para soltar. E aí, nós vamos fazer o que? Vamos prender os outros 11?’. Mas isso era um brainstorming, buscando uma solução, que já estava no campo do desconforto. Pelo menos, para mim estava”, declarou.
O ex-comandante também afirmou que alertou Bolsonaro sobre a inexistência de fraudes nas urnas:
“Eu falei com o presidente Bolsonaro: aconteça o que acontecer, no dia 1º de janeiro o senhor não será presidente”, disse.
Preocupação com medidas de exceção e documento suspeito
Baptista Junior relatou que, após a derrota eleitoral, os comandantes foram chamados repetidamente ao Alvorada para discutir a adoção de um decreto de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) ou mesmo um estado de defesa ou sítio. No entanto, ele disse ter ficado “muito preocupado” com os rumos das conversas.
“Eu comecei a achar que o objetivo de qualquer medida dessa, de exceção, era, sim, para não haver a assunção pelo presidente que foi eleito”, afirmou. “E a partir desse momento, e eu digo que isso aconteceu do dia 11 ao dia 14 (de novembro de 2022), eu fiquei bastante preocupado.”
Em 14 de dezembro, durante reunião no Ministério da Defesa, o então ministro Paulo Sérgio Nogueira apresentou um documento que, segundo o brigadeiro, sugeria impedir a posse de Lula.
“E aí eu falei: ‘Não admito sequer receber esse documento, não ficaria aqui’. Levantei, saí da sala e fui embora”, narrou.
Marinha teria oferecido tropas, e Exército ameaçou prender Bolsonaro
Questionado sobre a declaração de Garnier em relação aos “14 mil fuzileiros”, Baptista Junior explicou que o debate não se limitava a aspectos jurídicos.
“Nós não estávamos lá só para discutir base jurídica. Nós estávamos discutindo um ambiente e possibilidade. E isso foi o que o Garnier falou. Eu não fiquei sabendo à toa que a Marinha tem 14 mil fuzileiros”, afirmou.
Sobre a ameaça de prisão feita por Freire Gomes, o ex-comandante da FAB destacou o tom firme, mas respeitoso do general:
“O general Freire Gomes é uma pessoa polida, educada. Logicamente ele não falou essa parte com agressividade com o presidente da República, ele não faria isso. Mas é isso que ele falou. Com muita tranquilidade, com muita calma, mas colocou exatamente isso: ‘Se o senhor tiver que fazer isso, vou acabar lhe prendendo’”, disse.
Pressão sobre relatório das urnas
Baptista Junior também relatou que Bolsonaro pressionou pelo adiamento da divulgação de um relatório do Ministério da Defesa sobre as urnas eletrônicas, mesmo após ser informado de que não havia indícios de fraude. O ex-presidente chegou a entregar aos comandantes um documento do Instituto Voto Legal (IVL) para embasar uma ação no TSE.
“Comentei após o segundo turno, na reunião que nós tivemos no dia 1º de novembro. Depois comentei nas várias reuniões, cinco ou seis reuniões, que os comandantes e o ministro da Defesa tivemos com ele. E comentei com mais ênfase numa reunião no dia 14, quando ele me apresentou o relatório do IVL com um possível erro de programação”, afirmou.
Principais pontos do depoimento
- Reuniões no Alvorada: Discussões sobre medidas para impedir a posse de Lula, com ameaça de prisão a Bolsonaro.
- “14 mil fuzileiros”: Almir Garnier teria colocado tropas da Marinha à disposição do ex-presidente.
- “Brainstorming” golpista: Debates sobre a prisão de autoridades, incluindo Alexandre de Moraes.
- Relatório das urnas: Bolsonaro pressionou para adiar a divulgação de um documento oficial que não apontava fraudes.
O depoimento reforça as investigações sobre supostas tentativas de golpe envolvendo Bolsonaro e aliados. O caso segue em análise no STF
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