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Genocida de novo tipo

Com o pronunciamento de hoje (24) à noite, em rede nacional de rádio e televisão, Jair Bolsonaro credenciou-se de vez para entrar no funesto hall de genocidas da história. Diferentemente dos genocidas clássicos, que costumavam mandar matar os inimigos por meio de violência direta ou de inanição, Bolsonaro parece estar inaugurando um novo tipo de […]

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Foto: Isac Nóbrega/PR

Com o pronunciamento de hoje (24) à noite, em rede nacional de rádio e televisão, Jair Bolsonaro credenciou-se de vez para entrar no funesto hall de genocidas da história. Diferentemente dos genocidas clássicos, que costumavam mandar matar os inimigos por meio de violência direta ou de inanição, Bolsonaro parece estar inaugurando um novo tipo de genocídio: por desinformação.

Outra diferença é que não há um grupo inimigo a ser exterminado, muito embora o flagrante e inacreditável descaso do presidente com a morte de idosos lembre o programa de extermínio nazista que mirava os “incapazes” como doentes incuráveis, deficientes físicos ou idosos senis.

Se os prognósticos dos pesquisadores e as tendências observadas em países como Itália, Espanha e EUA forem confirmados aqui, teremos um número dantesco de mortos por conta do coronavírus. Boa parte destes deverá ser creditada à postura do presidente da República, que, contra todas as recomendações — inclusive as do Ministério da Saúde do seu próprio governo — conclamou a população que está em quarentena para que volte à vida normal. Milhares de mortes que poderiam ser evitadas poderão ocorrer por conta disso. Será, talvez, o primeiro genocídio por fake news da história.

Bolsonaro não está sozinho em sua empreitada assassina.

Grandes e conhecidos empresários estão escancarando sua desumanidade ao protestarem contra a quarentena. Alguns milhares de mortos não podem parar o país, dizem eles. É apenas uma questão numérica. Se milhares de “velhinhos” tiverem que morrer para a economia continuar girando, que seja. No capitalismo o dinheiro vale mais que a vida, já sabíamos, mas isto nunca esteve tão evidente.

Os bancos entopem a programação televisiva com propagandas adaptadas à pandemia, afirmando que estão prontos para cuidar das pessoas (risos); oferecer uma diminuta parte de seus lucros obscenos para ajudar a saúde pública sequer é uma hipótese. O Jornal Nacional faz reportagem melosa mostrando a vida (mais) dura (ainda) que os trabalhadores informais terão a partir de agora; mas a Globo apoia toda e qualquer medida ou projeto de lei que reitre direitos trabalhistas e jogue mais pessoas na informalidade. Políticos como João Doria e Rodrigo Maia defendem o corte de salários de trabalhadores do setor privado e público como alternativa, mas ninguém lembra que taxar os ricos ou mesmo suspender o pagamento da dívida pública seriam soluções extraordinariamente mais efetivas e infinitamente mais justas para a crise.

Bolsonaro é mais escrachado, mais cruel, mais perigoso, não há dúvida. Mas todos esses atores da direita limpinha brasileira têm também traços de psicopatia social. O problema é, repito, apenas numérico. Se uma porcentagem manejável da população estiver à própria sorte e os dados da economia estiverem rolando conforme deseja a banca, não há problema algum. Gente morrendo e sem condições de sobreviver só se torna problema quando para o país e, assim, afeta os tubarões.

É bastante óbvio que a prioridade número um, dois, três, quatro, cinco (etc.) de qualquer um que deseja evitar mortes de seres humanos deve ser derrubar Bolsonaro, seja de que jeito for. Para tal fim, que se forme uma ampla frente, sem discriminação alguma quanto aos componentes.

Estejamos preparados, contudo, para logo à frente fazermos a disputa contra a direita que até parece light perto de Bolsonaro, mas definitivamente não é.

Bolsonaro sempre foi um maníaco. Seus recorrentes elogios ao torturador Brilhante Ustra, por exemplo, sempre foram tratados como algo exótico, talvez um pouco rude. Fez-se vistas grossas ao seu arsenal de violências simbólicas e práticas em nome da agenda econômica. A Globo, que aparenta estar chocada com a boçalidade do presidente, há pouco tempo atrás entrevistou, por meio do Pedro Bial, o lunático Olavo de Carvalho como se estivesse tomando o depoimento de um grande intelectual. Olavo publicou vídeo esses dias dizendo que a cobertura jornalística sobre a pandemia é a “maior manipulação da opinião pública da história da humanidade” e que ninguém morreu por causa do coronavírus no mundo. E não é que ele tenha pirado agora; seu festival de besteiras monumentais é velho conhecido.

Quem apoiou ou mesmo permitiu que esse tipo de gente chegasse ao poder central do país precisa ser enfrentado com inteligência e afinco.

Inclusive no nosso campo.

Bolsonaro acabou de usar suas prerrogativas presidenciais para parar a programação das televisões e bater na imprensa. Completamente desarrazoado, é evidente, mas do ponto de vista da estratégia política ele identificou seu adversário e foi para cima. O PT, por sua vez, foi apeado do poder por um golpe de Estado sem sequer ameaçar fazer o embate direto com a mídia conservadora (a semeadora ideológica, digamos assim, do inferno que estamos vivendo). Quando havia motivos de sobra para fazê-lo, não usou o grande poder que tem o executivo federal para comunicar-se diretamente com a população e travar o bom combate. Se a guerra híbrida americana teve mesmo participação no golpe, foi uma das vitórias mais fáceis para o Tio Sam.

Não temos o direito de errar novamente. Todos que ajudaram a colocar um potencial genocida no cargo mais alto do país precisam revisar suas ações e traçar novas rotas. Do contrário, devem ser derrotados também.

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Pedro Breier

Pedro Breier nasceu no Rio Grande do Sul e hoje vive em São Paulo. É formado em direito e escreve sobre política n'O Cafezinho desde 2016.

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Comentários

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carlos

04/04/2020 - 15h09

Primeiro eu aconselho ao Paulo Guedes, com a sua teoria do estado mínimo, a assistir o filme o poço segundo eu aconselho o Bolsonaro mudar o lema do governo: dinheiro em cima dos ricos, e miséria em cima dos pobres.


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