Menu
, ,

Cafezinho Literário: conheça a escritora Patrícia Colmenero

Ela tem os cabelos ruivos, embora você não perceba na foto. E, tão intenso quanto a cor das madeixas, é o fluxo poético presente em sua obra. Patrícia Colmenero é brasiliense e autora do romance “Porque até a morte terei fome”. O livro é uma publicação independente que recebeu amparo do Fundo de Apoio à Cultura do Governo […]

4 comentários
Apoie o Cafezinho
Siga-nos no Siga-nos no Google News

Ela tem os cabelos ruivos, embora você não perceba na foto. E, tão intenso quanto a cor das madeixas, é o fluxo poético presente em sua obra. Patrícia Colmenero é brasiliense e autora do romance “Porque até a morte terei fome”. O livro é uma publicação independente que recebeu amparo do Fundo de Apoio à Cultura do Governo do Distrito Federal. Publicado em 2012, esse romance de estreia esmiúça os movimentos internos de uma mulher ante o fim de um relacionamento. No final do trecho do romance, que publicamos aqui com exclusividade, você pode ler uma breve entrevista com a autora.

Quero publicar também!

Hoje, você está conhecendo a Patrícia Colmenero. Mas, amanhã, é a sua obra que pode estar no Cafezinho Literário. Nosso chamado continua aberto. Saiba aqui as condições para submeter um texto, que não precisa ser inédito. Lembrando que todos podem enviar trabalhos para análise. No entanto, assinantes desta coluna recebem newsletter semanal com novidades incríveis sobre o universo dos livros. A existência do Cafezinho Literário depende da colaboração de autores e leitores como você. Participe!

Paulliny Gualberto Tort

Editora do Cafezinho Literário

Capa de "Porque até a morte terei fome", de Patrícia Colmenero

Capa de “Porque até a morte terei fome”, de Patrícia Colmenero

Porque até morte terei fome

de Patrícia Colmenero

Enterro meus pés na areia fofa. Enraízo.

Olhei para o mar e vi minha vida. Violência. Beleza. Suavidade. Quebras. Fundos e rasos.

Meus pais. Minha escola. Os homens. As mulheres. Livros. Filmes. Risadas.

Até as coisas perdidas – lixos jogados ao acaso voltaram pelas ondas feito garrafas vazias.

Todos parados lado a lado.

Olhei o mar e nomeei minhas ilusões.

Sentei-as em banquinhos de escola e chamei-as, uma por vez.

 

Estou pronta.

 

Pronunciei Eternidade e um garoto com o rosto de Túlio respondeu {o cabelo balançado por um vento que não existia}

– Eu sou Eternidade.

Uma gota cristalizada e velha desceu dos meus olhos: Ele era lindo. Tinha as bochechas rosadas como se tivesse corrido muito para chegar ali, os olhos bem abertos com uma curiosidade infantil, e a boca no ar, aguardando o que eu iria dizer. Mas devolvi o catarro e o choro para o corpo.

– Eternidade, você é o primeiro garotinho que irei enterrar.

 

Eu preciso começar a matar.

 

Me abaixei em direção à areia e, com os dedos entreabertos, com os sonhos entreabertos e os medos entreabertos, agora vomitando apenas água, só a lembrança, só um resto, escrevi. Com três dedos duros na areia seca-molhada, com a garganta seca e grossa, com o estômago seco e ardido, com a esperança seca seca – descamando.

Escrevi.

Túlio, amor eterno.

Porque você poderia dizer que te amei com amor despreparado, preenchido de sulcos e desatento. Raquítico. E eu sempre poderia afirmar que em tudo fui verdadeira, que tive os joelhos calejados de me arrastar até sua face, que aceitei seus beijos e desafetos

e isso poderia durar para sempre.

 

Mas nós não.

***

Entrevista com Patrícia, escritora tipo chama

Para começar, o básico: Quem é Patrícia Colmenero?

Escritora tipo chama (na nomenclatura de Calvino), interessada no texto poético, fluido e vivo. Co-criadora do movimento Leia Poetisas de incentivo à leitura de mulheres poetas. Professora apaixonada de literatura e roteiro cinematográfico.

Do que trata o livro “Porque até a morte terei fome”?

O livro se preocupa muito mais em ser linguagem do que mensagem, por isso, prefere um microenredo, para que a escolha das palavras que faça o texto. A história trata de uma mulher que, esquecida de seu lugar no mundo, se vê fragilizada diante do final do relacionamento com seu chefe. A busca dessa mulher, protoescritora, pelas palavras e pela identidade, é a jornada do livro.

Para você, o que é Literatura feminina?

A literatura feminina deve ser escrita por mulheres. Esse é o lugar de fala das escritoras, garantido, infelizmente, apenas pela fragilidade e opressão subjetivante de um nome. Como diz Lacan, sem um nome, a coisa não existe. É um espaço de resistência à participação de 30% nas grandes editoras brasileiras, ao mito do neutro.

A literatura feminina é protagonizada por personagens mulheres, mas não é somente para mulheres. Esse é o problema da insígnia chick lit que prevê, muitas vezes, que a literatura feita por mulheres se trata de comédias românticas e livros cor-de-rosa.

A literatura feminina deve problematizar as funções dramáticas de suas personagens. Não adianta fazer a mulher existir como personagem se essa existência é apenas uma cópia da escrita que sempre habitou nossas estantes. E esse é o maior desafio, já que a maior parte dos livros que uma mulher lê é publicada por homens.

Que conselho daria às mulheres que desejam escrever?

Escrevam, apesar de tudo. Esse é o único jeito de uma mulher escrever, no apesar, e essa é a força da literatura feminina. Uma escrita que, por natureza, resiste.

 

 

Apoie o Cafezinho

Paulliny Gualberto Tort

Mais matérias deste colunista
Siga-nos no Siga-nos no Google News

Comentários

Os comentários aqui postados são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam a opinião do site O CAFEZINHO. Todos as mensagens são moderadas. Não serão aceitos comentários com ofensas, com links externos ao site, e em letras maiúsculas. Em casos de ofensas pessoais, preconceituosas, ou que incitem o ódio e a violência, denuncie.

Escrever comentário

Escreva seu comentário

Helena

22/05/2016 - 11h50

Gostei, ela tem inspiração e isso se manifesta na multiplicação das imagens inesperadas, e na surpresa das frases, que lembram as derivações numa frase musical (“Com três dedos duros na areia seca-molhada, com a garganta seca e
grossa, com o estômago seco e ardido, com a esperança seca seca”). Me lembra, mas tb me faz esquecer, pq é audivelmente diferente, Clarice.

Reinaldo Mechica Miguel

22/05/2016 - 05h58

Juntando Patrícia Colmenero e Chico Buarque teremos um FLUXO TORRENCIAL DE POESIA! Será como JUNTAR FEIJÃO COM ARROZ para saciá-los desta fome.
“Porque até a morte terei fome”…

Hermes Rosa

22/05/2016 - 04h36

Com todo respeito Miguel, leio diariamente seus artigos, com os quais eu mais me identifico dentre tantos blogs, e fico um tanto angustiado pelos recentes acontecimentos por você descritos.Agora confesso: “Patricia é um verdadeiro refrigério”… abraço

    Paulliny Gualberto Tort

    22/05/2016 - 14h15

    Olá, Hermes! Aqui quem escreve é a Paulliny, editora do Cafezinho Literário. Fico feliz que tenha gostado do trabalho da Patrícia Colmenero. Tenho certeza de que o Miguel vai ficar feliz também. Abraços


Leia mais

Recentes

Recentes