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A conta do golpe de Estado e outras coisas

[s2If !current_user_can(access_s2member_level1) OR current_user_can(access_s2member_level1)] (Foto: Mídia Ninja). Análise Diária de Conjuntura – 02/06/2016 Na madrugada desta quinta-feira, a Câmara Federal dos Deputados aprovou uma série de pautas bombas que serão pagas integralmente com déficit público, beneficiando a elite da burocracia estatal. A educação, a saúde, a infraestrutura, os serviços destinados ao conjunto da população, ficaram […]

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(Foto: Mídia Ninja).

Análise Diária de Conjuntura – 02/06/2016

Na madrugada desta quinta-feira, a Câmara Federal dos Deputados aprovou uma série de pautas bombas que serão pagas integralmente com déficit público, beneficiando a elite da burocracia estatal.

A educação, a saúde, a infraestrutura, os serviços destinados ao conjunto da população, ficaram de fora.

Vou repetir: enquanto o governo Temer promete realizar – e já começou a fazê-lo – o maior corte de gastos da história com as despesas públicas mais essenciais, como hospitais, universidades, merendas escolares, programas sociais, financiamentos de casa própria, aposentadorias, ele aprova, na calada da noite, um projeto que eleva exponencialmente os gastos públicos unicamente com a elite da elite do funcionalismo, como procuradores, juízes, servidores do TCU, advogados gerais da união, ou seja, justamente aqueles que já ganham salários estratosféricos se comparados com seus congêneres em outros países, ainda mais considerando os penduricalhos infinitos que fazem suas rendas mensais chegarem níveis verdadeiramente nababescos.

Essa incoerência tem uma explicação simples: é a conta do golpe.

O governo Temer tem sido, desde o início, apenas o fantoche de um golpe dado, em verdade, pela elite do funcionalismo público, em especial servidores do TCU, do MPF e do Judiciário, com auxílio luxuoso da mídia corporativa.[/s2If]

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Os parlamentares que conspiraram pelo impeachment, conforme já se deixou entrever por gravações vazadas, agiram como ratinhos de laboratório se deslocando de um ponto a outro sob o impulso de choques elétricos manipulados conscienciosamente pela alta burocracia do Estado, que adquiriu, ao longo dos últimos anos, com auxílio da mídia, um poder descomunal.

A classe política, na comparação com setores da alta burocracia, em especial aquela ligada ao universo judicial, tem um poder bastante limitado, sobretudo em se tratando de blindagem contra investigações e punições.

A procuradoria-geral da república se tornou o poder de facto no país, na medida em que os procuradores ligados à PGR (assim como qualquer membro do MP) não podem ser investigados nem pela Polícia Federal, não passam pelo crivo popular, e tem um poder de agressão sem limites contra qualquer empresa ou cidadão brasileiros.

O poder político tende a migrar para quem tem o monopólio da violência. O Executivo, que deveria ser o legítimo e único dono desse monopólio, pois tem legitimidade popular conferida pelo sufrágio universal, perdeu a prerrogativa para uma Procuradoria Geral da República associada politicamente a todas as carreiras de elite do Estado, incluindo aí a Polícia Federal.

Essa é a explicação mais plausível para a loucura que vivemos. Apenas uma alta burocracia estatal, historicamente hostil ao poder emanado das urnas, que leva ao poder indivíduos que ela, a elite burocrática, considera como “inferiores”, poderia liderar uma conspiração golpista tão despreocupada com as consequências econômicas e sociais de uma crise política levada a seus limites mais extremos.

Isso explica inclusive essa convergência, bizarra, porém racional, entre os núcleos mais criminosos do golpismo, e os setores do movimento social, contra a criminalização radical da atividade política.

Os criminosos do golpismo rejeitam a criminalização da política pela razão dupla de pretenderem continuar no crime e por serem políticos.

Os movimentos sociais rejeitam a criminalização da atividade política porque entendem que essa é a fórmula mais rápida para serem destruídos.

Então o que a gente assistiu no Brasil foi o seguinte: uma associação entre setores rentistas do capital, que lucram com a crise, e a alta burocracia do Estado.

É uma associação assustadoramente higiênica e limpa, com aspas, na medida em que nenhum dos dois setores precisa lidar com assuntos carregados de dilemas, envolvendo produção, sociedade, política.

Mesmo o político mais corrupto, mais canalha, precisa se preocupar com o povo, porque é o povo que o elege, então ele precisa construir uma estrada, um hospital, um túnel, um posto de saúde, uma pracinha para as crianças brincarem.

Um servidor do TCU não precisa fazer nada, porque ele é um funcionário vitalício. A mesma coisa vale para um procurador ou um juiz.

Os rentistas tem o mesmo privilégio. Se o desemprego avança, se a inflação dispara, se os juros crescem, eles ganham ainda mais dinheiro.

Entre num banco de investimento qualquer: o gerente explicará a você como ganhar com juros altos, com inflação alta, etc.

Evidentemente, esse não é um modelo sustentável para nenhum país, de maneira que estamos diante de um período necessariamente provisório, em que setores da elite tentarão usar o caos político para realizar uma série de saques contra a economia popular.

Isso já está acontecendo. A aprovação do déficit de 170 bilhões de reais seria ótimo, se o governo se dispusesse a usar o dinheiro para dinamizar a economia doméstica, com grandes obras de infraestrutura, que gerassem emprego, incluindo construção de hospitais, universidades, escolas, que também devem ser incluídos na seção infraestrutura.

O Brasil precisa, por exemplo, de um grande choque em sua infraestrutura de mobilidade urbana. O governo Dilma, aliás, foi a administração que mais investiu, na história do Brasil, em infraestrutura, e mesmo assim ainda era necessário muito mais.

O país precisa de uma reforma de Estado que corte privilégios da alta burocracia do Estado. Não faz sentido que servidores do Banco Central ganhem salários de R$ 60 mil, que desembargadores ganhem R$ 150 mil ou R$ 200 mil por mês.

A estrutura do nosso Estado se tornou profundamente desequilibrada. Somos o país em que juízes e procuradores ganham os maiores salários do mundo, para funções similares em outros países, e os professores e enfermeiros ganham salários irrisórios.

O golpe aconteceu também porque as próprias corporações perceberam que o processo democrático naturalmente corrigiria essas distorções. Enquanto o Estado tinha dinheiro sobrando, o governo conseguiu tocar o barco sem mexer nos privilégios. Na medida em que entramos num período de vacas magras, o corporativismo tratou de dar um golpe para usurpar o poder democrático, antes que seus privilégios fossem tocados.

Isso explica também os vazamentos das gravações de Sergio Machado: era uma estratégia para debilitar politicamente o governo Temer, transferindo ainda mais poder às corporações.

O irônico – e trágico – é que a crise econômica também foi causada, em boa parte, pela maneira intolerante, quase fascista, com que as corporações decidiram fazer política, sobretudo a partir da Lava Jato, operação na qual grandes empresas nacionais, estratégicas para o nosso desenvolvimento econômico (independente de seus problemas de corrupção, que deveriam ser atacados cirurgicamente), foram virtualmente destruídas.

A destruição dessas empresas produziu um efeito dominó que a grande imprensa nunca se preocupou em monitorar, até porque o clima de agressividade política, o clima de golpe, atingiu tal paroxismo que qualquer crítica à Lava Jato era automaticamente criminalizada também.

Há tempos não vemos nenhuma pesquisa qualificada sobre como a população vê o golpe de Estado.

Estamos no escuro, em todos os sentidos. A imprensa corporativa se tornou um foco tão virulento, tão desesperado, de desinformação e mentira que milhões de pessoas preferem simplesmente não lerem nada por aí.

Ao mesmo tempo, a imprensa alternativa sofre um ataque violentíssimo por parte dessa mesma imprensa, como se vê na sucessão de editoriais – no Globo, na Folha, no Estadão, na Veja, enfim, nos suspeitos golpistas de sempre.

A política, porém, não morre. Manifestações tem ocorrido em todo país, numa intensidade surpreendente até pelas vanguardas políticas. Não são mostradas na grande mídia, mas produzem mudanças efetivas na opinião pública – a verdadeira, e não as dos auditórios da Globo.

As poucas pesquisas que tem sido feitas mostram uma reversão bastante rápida da opinião pública. O novo governo não apenas carece de legitimidade: ele não tem base social. Dilma, em sua fase mais difícil, ainda tinha o apoio de movimentos sociais e sindicatos. Temer, não tem de ninguém.

É uma coisa esquizofrênica.

Enquanto Dilma, vencedora das eleições, transita pelo Brasil aclamada nas ruas e nas universidades, Temer e seus acólitos precisam se esconder o tempo inteiro.

Ficou bem claro que o grande “clamor popular” contra Dilma foi artificialmente inflado pelos meios de comunicação, mancomunados com a alta burocracia, que agora mostra suas garras cobrando preço altíssimo aos cofres do Estado e à população mais pobre.

Temer e seus coleguinhas conspiradores do PMDB e PSDB foram os ratinhos de laboratório manipulados e aterrorizados pela Globo e pela PGR para derrubarem o governo.

Para que o poder não suba à cabeça dos ratinhos, a Globo os irá manter em estado de terror o tempo inteiro. Um governo fraco, impopular, dependente exclusivamente da boa vontade do grande capital, da mídia, do PGR e do STF, é o que há de melhor para a Globo.

Entretanto, o que a grande imprensa não fará jamais, é dar voz aos que denunciam o golpe. Essa é a brecha principal na estratégia golpista: a surpreendente resiliência das forças que denunciam a violação da democracia – e a aceitação dessa denúncia pela opinião internacional.

É por aí também que a violência midiática se torna mais visível. A grande imprensa brasileira esconde os atos contra o golpe e isso evidentemente é uma violência absurda contra o direito à informação, sobretudo quando lembramos que essas empresas usufruem de concessões públicas.

Ela também esconde os atos e as reportagens que tem saído no exterior: outra violência contra o direito à informação previsto na Constituição.

A esquerda organizada brasileira, por sua vez, se vê diante de um desafio para o qual ela não estava preparada. De repente, ficou patente o profundo provincianismo da nossa esquerda organizada, que jamais montou uma estratégia decente, nem sequer quando ocupou o governo, para defender suas ideias lá fora.

É perigoso, contudo, depender da imprensa internacional. Se não montar, urgentemente, uma estratégia inteligente para exercer influência ativa sobre a narrativa dos acontecimentos, a esquerda brasileira irá também perder essa batalha. Até agora, a esquerda brasileira teve um papel passivo diante da imprensa internacional, recebendo e disseminando no Brasil reportagens veiculadas lá fora que denunciam o golpe. Esse papel precisa ser ativo, em especial nos Estados Unidos e Europa.

Nos EUA, é preciso fazer um trabalho junto à opinião pública, que é bastante descolada e desconfiada das posições de seu governo. As universidades americanas são um campo aberto para a veiculação de denúncias contra o golpe perpetrado no Brasil.

Na Europa, temos um vasto universo de parlamentares e partidos de esquerda. Se o partido social-democrata alemão (SPD), que é a ala mais conservadora da esquerda alemã, soltou nota contra o golpe, isso significa que a tendência de toda a esquerda europeia é se alinhar contra o golpe no Brasil. Mas isso tem de ser trabalhado.

A passividade e inação da esquerda brasileira, em especial do PT, que teria mais instrumentos para agir neste sentido, já está provocando algumas derrotas. Por exemplo, o atual ministro das relações exteriores, José Serra, conseguiu produzir algumas imagens com membros do governo francês hoje. A esquerda francesa hoje, a real, não a representada pelo presidente mais impopular da história da França (o atual, o “socialista” François Hollande, apoiador de todas as aventuras imperialistas no oriente médio), tem crescido nas ruas, na esteira das violências que os setores conservadores querem impor à classe trabalhadora do país, e já deu vários sinais de apoio à luta pela democracia no Brasil. É preciso alinhavar essas estratégias, porém, de maneira um pouco mais institucional.

A votação no Senado – Nos últimos dias, tem saído matérias que falam sobre a possibilidade do impeachment ser derrotado no Senado. Tudo pode acontecer, mas o blog agora prefere assistir a tudo com ceticismo. O que rola é um grande teatro. As forças que apoiaram o golpe disputam entre si o poder de influenciar e controlar o novo governo. Para isso, é necessário mantê-lo, como já disse acima, em estado de eterna insegurança. As forças golpistas, porém, sabem que, à medida que a votação do impeachment se aproximar, todas as críticas midiáticas ao novo governo serão interrompidas provisoriamente ao mesmo tempo que factoides contra o PT voltarão às manchetes. A eventual prisão de Lula, por exemplo, sobre a qual se lançam boatos diariamente, é uma carta poderosa na manga do golpe, e poderá ser usada na véspera da votação do impeachment, com vistas a lançar o país no caos e aterrorizar os senadores ainda indecisos, forçando-os a votar em favor do golpe.

PGR, Judiciário, TCU já deram sinais bastante evidentes de que lado estão. Temer pede um déficit de R$ 170 bilhões, a maior “pedalada” da nossa história e ninguém no TCU dá um pio. Dilma mexe aqui e ali, sem aumentar déficit, para pagar a conta de programas sociais, hospitais universitários e até mesmo concursos públicos para juízes, e o staff do TCU faz um tour pelos jornais para defender o impeachment.

A Lava Jato, por sua vez, se tornou um instrumento perfeito para o golpe. Há delações e documentos para ameaçar e coagir qualquer político ou magistrado que se opor a ele. A partir do momento que os próprios políticos já identificaram, conforme ficou patente nas gravações vazadas à imprensa (o golpe não consegue controlar tudo), que há uma convergência profunda entre imprensa e Lava Jato para “tirar o PT” do poder, custe o que custar, eles, os políticos, sabem, instintivamente, que serão alvejados e perseguidos caso se tornem um obstáculo ao golpe. Alguns mais ousados até se arriscam a fazer jogo duro, ou acenam para os dois lados, não por dúvida real, ou preocupados com seu lugar na história, mas para vender mais caro a sua posição e, eventualmente, cavar um lugar no novo governo.

[Prezados assinantes, no sábado e no domingo, excepcionalmente, farei análises de conjuntura para compensar o furo de terça e quarta. Eu estava fora do país e tive alguns problemas técnicos nesses dias. ]

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Miguel do Rosário

Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.

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