Menu

Ciro e Boulos: convergências programáticas relevantes. Por Diego Baptista

Ciro e Boulos: convergências programáticas relevantes Por Diego Baptista Ciro (60) e Boulos (36), trajetórias e perfis muito distintos sob vários aspectos, tanto quanto o lastro, a articulação e o significado de suas candidaturas. Estes dois postulantes à presidência da república partilham a fortuna de serem, eleitoralmente, os maiores beneficiários do alijamento de Lula da […]

7 comentários
Apoie o Cafezinho
Siga-nos no Siga-nos no Google News

Ciro e Boulos: convergências programáticas relevantes

Por Diego Baptista

Ciro (60) e Boulos (36), trajetórias e perfis muito distintos sob vários aspectos, tanto quanto o lastro, a articulação e o significado de suas candidaturas. Estes dois postulantes à presidência da república partilham a fortuna de serem, eleitoralmente, os maiores beneficiários do alijamento de Lula da disputa.

O PT ficou acéfalo e tem visto progressivamente abalada a hegemonia que detinha no seu campo político; sem Hulk nem Batman pra socorrer, a centro-direita segue à cata de candidato; Alckmin (PSDB), mesmo pilotando a máquina paulista e já tendo concorrido, não consegue decolar, e seu partido também vive uma grave crise. O contexto é de de(s)composição generalizada das forças políticas. A um semestre do pleito de outubro de 2018 (caso ocorra), o cenário segue fragmentado e indefinido de um modo sem precedentes na história política da nova república.

Atento a esta tendência de fragilização dos possíveis competidores, Ciro Gomes (PDT) está em pré-campanha aberta desde o ano passado e agora busca consolidar a segunda posição abaixo do capitão Bolsomerda (que ladra mas sobre cuja consistência eleitoral pairam mais do que dúvidas). Guilherme Boulos (PSOL) parte do zero, apresentou-se como candidato apenas recentemente e vai começando a aparecer ao público mais amplo; bem preparado, sereno e firme, de comunicação hábil e discurso consistente, revela potencial de crescimento, mesmo que limitado e relativo, com o desafio de atravessar a campanha, que será curta e naturalmente desigual.

Considere-se que em algum momento ainda no primeiro turno se forme uma chapa encabeçada por Ciro (com PSB, PCdoB, PT, …), que vai forte ao segundo turno contra uma frágil candidatura da centro-direita que se viabilize. É notório que Ciro tem desvantagens idiossincráticas e um espontaneísmo que podem leva-lo a cometer gafes, mas ele também apresenta credenciais de experiente trajetória política e vida acadêmica, além de dominar os temas com grande desenvoltura.

Boulos seguiria tocando sua campanha no primeiro turno, com um boa performance em entrevistas, debates, comícios e demais aparições públicas, contando com a mobilização das militâncias e do partido. Angariando alguma porcentagem dos votos remanescentes de Lula (30%) e dos nulos-brancos e indecisos atuais (45%), Boulos pode, numa hipótese otimista, buscar os dois dígitos, obtendo maior relevância como apoiador no segundo turno: reforçando pautas importantes, projetando-se politicamente e acumulando forças para sua fração num futuro governo.

Não seria difícil justificar este apoio a Ciro, e não apenas em resistência à pororoca conservadora e a ameaça de sedimentação e aprofundamento do retrocesso em curso acelerado. Há também afinidades na leitura do quadro político recente (a alegação de “golpe” contra Dilma, a denúncia da criminosidade da camarilha conspiradora que assumiu, a avaliação de que a prisão de Lula foi injusta e casuística – neste caso com diferentes ênfases). Igualmente, alinha-se o posicionamento crítico ao ciclo de governos petista, seja em termos de políticas e realizações ou das práticas de governabilidade, mas também o reconhecimento de determinados avanços. Porém sobretudo programaticamente a aliança parece inevitável.

Acompanhando dezenas de entrevistas, atos e palestras de ambos nos últimos meses, constatamos nos discursos de Ciro e Boulos uma série de importantes pontos convergentes em termos de propostas [completar e detalhar – e considerado que ainda não há propriamente documentos de programa].

Economia

Reforma tributária: progressividade, faixas de IR, taxaçao sobre lucros e dividendos, fortunas, heranças. Reoneração (bolsa empresário). Simplificação. Combate à sonegação. Outros pontos: impostos territoriais e sobre propriedade, oneração e desoneração de determinados itens de consumo, de produção e investimento. (Pauta estrutural, fator muito forte de unidade).

Revogações: PEC do teto, da reforma trabalhista e outras medidas do governo Temer. Reapropriação de empresas (eletrobrás, embraer) e campos de petróleo privatizados no governo Temer. (Unidade simples e direta).

Reforma da previdência: necessidade de uma reforma que foque no corte de privilégios. (setores do regime público, acúmulos de aposentadorias e pensões especiais, magistratura, forças armadas). Cobrança de dívidas. Auditoria.

Política econômica: contenção de juros e câmbio, regulação do mercado financeiro, estímulo à descartelização bancária, crédito; papel dos bancos públicos, gestão do BC. (ver questão do tripé), contra um ajuste fiscal pela via do corte (austericídio).

Estado indutor, investimento público, estimulo a reindustrialização (“Neo-nacional-desenvolvimentismo”).

Política

Convocação sistemática de referendos e plebiscitos (ponto de contato forte). Boulos inclui ainda outros mecanismos de decisão e representação popular.

PMDB vai ser posto na oposição pela primeira vez. Não governamos com o PMDB.

Conflui o discurso legalista, de defender em vários pontos o simples cumprimento da constituição. Do mesmo modo, a casos internacionais para apoiar determinados temas (como plebiscitos, tributação, a explicitação de distorções, bizarrices e jabuticabas tupiniquins). Essa insistência na lei e no exemplo é apaziguadora, indica que não se trata de instituir qualquer transição socialista, atua dentro dos limites político-institucionais e das regras de exercício do poder ora em disputa – e nem se poderia exigir outra coisa de partidos políticos e de políticos.

Outros temas importantes

Reforma política e do judiciário (reforma do estado).

Segurança pública: necessidade de incorporar essa pauta tradicional da direita. Redesenho da segurança pública. Sistema carcerário. Política de drogas.

Questão do pacto federativo (envolve reforma tributária, da previdência, dívida etc.).

Postura diante da dívida pública (este não é o maior problema).

Pontos carentes de ajustes

Reforma agrária e urbana: Ciro não enfatiza estes pontos centrais como Boulos faz (aliás Ciro contemporiza com o Agronegócio). Convergência pode ser construída com base no critério do legalismo.

Meios de comunicação. Ciro ainda vacila neste tema (mas já está voltando atrás e relativizando sua defesa do controle remoto). Fala em estímulo de produtores locais. Tende a acatar determinações constitucionais quanto à proibição propriedade cruzada, rede nacional, etc., assim como ataca a concessão de rádios e TVs para políticos.

Pautas comportamentais e identitárias. Temas ditos polêmicos, como aborto e drogas. Ciro afirma claramente que não tratará este âmbito como tabu, e insiste que é preciso resguardar o estado laico e os cidadãos privados da alçada da religião. Aqui apenas tem de valer o liberalismo. Chamar a discussão com a sociedade civil e eventualmente plebiscitos.

Diego Baptista é bacharel em Filosofia-USP e Doutor em Sociologia-Unicamp.

Apoie o Cafezinho

Miguel do Rosário

Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.

Mais matérias deste colunista
Siga-nos no Siga-nos no Google News

Comentários

Os comentários aqui postados são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam a opinião do site O CAFEZINHO. Todos as mensagens são moderadas. Não serão aceitos comentários com ofensas, com links externos ao site, e em letras maiúsculas. Em casos de ofensas pessoais, preconceituosas, ou que incitem o ódio e a violência, denuncie.

Escrever comentário

Escreva seu comentário

Beto Castro

17/05/2018 - 23h29

Nas vésperas da prisão do Presidente Lula estavam os dois abraçados com ele no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC. Lula abraçou os dois e os nomeou seus herdeiros políticos num verdadeiro ato falho. São apenas belolinhas iniciantes sem densidade eleitoral. O congresso está perdendo dois deputados federais importantes. O Presidente Lula pisou na bola, pois seus verdadeiros herdeiros são os Senadores Paulo Paim, Lindbergh Farias, Gleisi Hoffmann, além de Fernando Haddad e pasmem o Governador Ricardo Coutinho do PSB que foi expulso do PT pela sua qualidade. O PT tem que abolir o seu caciquismo político se não quiser naufragar e morrer na praia. São dois apressadinhos bem pragmáticos e pouco leais. Políticos são bichos tinhosos e imprevisíveis.

Marcelo abb

17/05/2018 - 21h52

Os petistas estão tratando as eleições como se o que importasse são os que são “mais PT” ou “menos PT”.

As ideias foram postas de lado, as alianças e estratégias também. Agora o que importa é o que o candidato fala do PT. Se defende, tudo bem. Se crítica, mesmo que seja uma crítica justa, fundamentada e merecida, aí vira o traidor, golpista, reaça…

José Soares

17/05/2018 - 16h10

Vai ser difícil fazer um debate construtivo com afirmações do tipo: “O PT ficou acéfalo”

    Marcelo abb

    17/05/2018 - 21h50

    Mas o PT de fato ficou acéfalo.

    Ultra Mario

    17/05/2018 - 22h14

    E não ficou? Veja as declarações ridículas da Gleisi.

    Após deixar a Dilma cair e o Lula ser preso, o PT não aceita que perdeu a hegemonia do pensamento de esquerda.

    Na minha opinião isso é excelente pois a Manuela, o Boulos e o Ciro representam uma esquerda muito mais moderna.

Luiz Pereira

17/05/2018 - 15h03

E dá para confiar no PSOL? O partido de esquerda que mais atacou Dilma e elogiou a lava-jato? Luciana Genro bateu no PT, disse que o golpe era estratégia de vitimização do PT, justo no processo de cotação do impeachment, quando o PT mais precisava de apoio. Plínio Arruda Sampaio bateu na Dilma a ponto que na eleição contra Serra apoiou o Serra. Antes dos dois tinha Heloísa Helena mais anti-petista que Jair Bolsonaro. Randolfe Rodrigues quando era do PSOL atacava o PT com mais virulência que a direita. O PSOL ajudou a derrubar o PT do governo, dá para confiar? Fica difícil defender quem dizia que o governo Dilma era indefensável, sabendo que a queda da Dilma iniciaria a “Ponte para o Futuro” que já estava anunciada pelo PMDB.

    Rafael

    17/05/2018 - 18h28

    “justo no processo de cotação do impeachment, quando o PT mais precisava de apoio.” Companheiro, não importam nem um pouco as críticas que o PSOL e a maioria dos partidos de esquerda fizeram, digamos que com a legitimidade da própria faculdade racional, aos governos e as decisões do PT no poder. Na hora em que se viu um golpe de estado em marcha, todos, com exceção do PSTU, apoiaram Dilma e o PT em sua denúncia. De onde diabos você arranca essa súbita “falta de confiança”? Pelo PSOL encarnar, como razão de nascimento inclusive, a própria esquerda que Lula e Dilma não tiveram forças para impor? Pelo concilialismo exarcerbado no qual ambos capitularam?
    “O PSOL ajudou a derrubar o PT do governo, dá para confiar?”
    Não é difícil perceber que o próprio PT criou e permitiu muitas das dificuldades que hoje enfrenta, da atual composição do supremo às “liberalidades” pirotécnicas do judiciário atual, do PMDB golpista em cargos estratégicos ao abafamento dos movimentos sociais e sindicatos por quase uma década. Tomar o ainda franzino PSOL de bode expiatório não irá lhes exorcizar de nada.


Leia mais

Recentes

Recentes