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A vitória da direita nas eleições municipais e a falta de projeto do governo Lula

A recente onda eleitoral que varreu as cidades brasileiras nas eleições municipais de 2024, revela um cenário que muitos analistas políticos e eleitores já suspeitavam, mas que agora se confirma com números concretos: a direita, em suas múltiplas facetas (centro, tradicional e em menor e barulhenta proporção a extrema), celebra um crescimento expressivo em seu […]

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A recente onda eleitoral que varreu as cidades brasileiras nas eleições municipais de 2024, revela um cenário que muitos analistas políticos e eleitores já suspeitavam, mas que agora se confirma com números concretos: a direita, em suas múltiplas facetas (centro, tradicional e em menor e barulhenta proporção a extrema), celebra um crescimento expressivo em seu eleitorado.

Esse fenômeno merece uma análise detalhada, não apenas dos números frios, mas também das implicações mais profundas que o resultado das urnas trazem para o cenário político nacional.

Inicialmente, é preciso reconhecer que o espectro político da direita é diverso, abrangendo desde a direita ideológica até a pragmática, e até mesmo marcando presença em partidos tradicionalmente da centro-esquerda clássica (PSB, PDT e PT).

Essa diversidade se refletiu claramente nos resultados eleitorais. Coletivamente, os partidos que variam do centro à extrema-direita acumularam impressionantes 91,2 milhões de votos, um salto considerável em relação aos 80,1 milhões obtidos em 2020, durante um período tumultuado pela pandemia e pelo negacionismo em marcha liderado pelo então presidente Bolsonaro.

Em contraste, a esquerda “raiz” e centro-esquerda estagnaram, com um crescimento mínimo de votos, passando de 21,9 milhões em 2020 para 22,3 milhões em 2024. Essa variação pífia sugere não apenas uma dificuldade em ganhar novos eleitores pelo anacronismo do discurso, da estratégia e das análises, mas também em manter os existentes, considerando o crescimento do eleitorado durante esse período.

Destaca-se, no entanto, o desempenho de partidos como PSB e PT, que viram aumentos modestos e insuficientes para contrabalançar as perdas de outros grupos como PDT, PV, PCdoB (que praticamente sumiu do mapa ao conquistar apenas 19 prefeituras) e a Rede.

Esses resultados são ainda mais dramáticos quando consideramos o alto número de votos brancos, nulos e abstenções, que somam quase 42,4 milhões, quase o dobro do total de votos da centro-esquerda e esquerda juntas.

As implicações desses números são vastas. Primeiramente, confirmam uma inclinação do eleitorado brasileiro à direita, uma tendência que não é nova, mas que se solidifica mais a cada ciclo eleitoral.

Interessante notar que, apesar de perder a eleição presidencial em 2022, a direita conseguiu não apenas manter, mas expandir sua base. Isso sugere uma resiliência e uma estratégia de mobilização e marketing político eficaz por parte desses partidos, algo que a esquerda parece não ter conseguido replicar com a mesma eficácia.

Mas há quem diga: “Ah, mas o Lula foi eleito três vezes”. Sim, é verdade. Mas essa afirmação acaba se tornando rasteira e conformista por não considerar que a figura política de Lula transcende o petismo e seus satélites. Tanto é que o partido encontra dificuldades para construir um nome que possa não apenas substituí-lo , mas de agregar o mesmo peso político de sua liderança.

No Nordeste, por exemplo, onde Lula sempre foi campeão de votos, a direita tradicional ainda domina o interior dos estados e em sete capitais. Em Salvador, por exemplo, Bruno Reis (União Brasil) se reelegeu em 1° turno com impressionantes 79,6% dos votos válidos.

Em números, o candidato do carlismo recebeu 1.045.690 votos, enquanto Geraldo Jr. (MDB), candidato apoiado abertamente por Lula e toda a máquina estadual, ficou no longínquo terceiro lugar com 10,3% dos votos válidos, carimbando o pior desempenho de um candidato apoiado pelo petismo em 32 anos.

Em Teresina, as pesquisas apontavam a vitória de Fábio Novo, do PT, apoiado por Lula e o governador Rafael Fonteles (PT), mas quando as urnas abriram, Silvio Mendes (União Brasil), apoiado pela direita e pelo senador Ciro Nogueira (PP), expoente do bolsonarismo no estado, foi eleitono 1° turno com 52,1% dos votos.

Citei esses dois casos porque em todas as eleições presidenciais que disputou, Lula sempre registrou as maiores quantidades de voto na região. Em 2022, o presidente venceu na Bahia com 72% e no Piauí com esmagadores 76,8% dos votos no estado.

Esse fortalecimento da direita nas eleições deste ano também contrasta com a falta de um projeto robusto, vigoroso e que se diferencia estruturalmente por parte do governo Lula.

Não há no presente momento uma disposição do governo de apresentar um projeto concreto (e não apenas simbólico) que faça o Brasil avançar em áreas sensíveis ao desenvolvimento de qualquer país como um complexo industrial da saúde, projetos de infraestrutura, transportes, ciência e tecnologia.

Digo isso não com a ilusão de achar que com um projeto de país que empolgue e engaje os brasileiros a esquerda se fortalecerá do dia pra noite, não se trata disso. Mas, é de bom grado, e lúcido analisar, que o estrago para esse campo seria bem menor.

No momento, a atuação do governo é focada em administrar a economia com melhoras quantitativas como, por exemplo, a inflação controlada e com os menores índices de desemprego em uma década.

Mas qual a qualidade desses empregos? Isso está diminuindo a informalidade gritante no país? Está sendo suficiente para cumprir o que o próprio Lula prometeu em 2022? Como essa inflação sob controle está ajudando a melhorar a qualidade da renda dos brasileiros?

Segundo os dados da Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílios (PNAD), realizado pelo IBGE, a informalidade no Brasil cresceu 0,3% no trimestre encerrado em julho deste ano, atingindo 39,4 milhões de pessoas. Esse foi o 2° maior patamar da série histórica.

Nesse mesmo trimestre, o emprego informal cresceu 1,1%, ao mesmo tempo que o ritmo de ocupação cresceu 1,2%. O fato é que o emprego informal cresceu e isso corrobora com essa lógica do individualismo pregada pela direita brasileira e seus porta-vozes, ao mesmo tempo em que ela investe num discurso que simula a  mudança do “sistema”.

Mas de volta a política, a ascensão do Partido Liberal, comandado por Valdemar e Bolsonaro, chama atenção. O salto de 4,7 milhões de votos em 2020 para 15,7 milhões em 2024 é um indicativo de que, mesmo com a perda da presidência, as bases mais à direita estão se fortalecendo, possivelmente capitalizando esse descontentamento com o status quo.

Além disso, o fortalecimento da extrema-direita pode ser visto tanto como uma resposta às políticas atuais quanto como um indicativo de uma possível virada ainda mais conservadora no futuro político do país.

Frente a essa realidade, é fundamental que a esquerda brasileira reflita e reestruture sua abordagem. A falta de crescimento e a perda de eleitorado mostram que não basta apenas manter as narrativas anacrônicas e confomistas ou esperar que as falhas dos adversários sejam suficientes para garantir vitórias como, por exemplo, em Fortaleza, onde o candidato bolsonarista André Fernandes (PL), fechou o 1° turno com mais de 40% dos votos e se tornou favorito para vencer o 2° turno contra Evandro Leitão (PT).

LEIA: Candidato de Bolsonaro ganhou na maioria dos bairros periféricos de Fortaleza

É necessário se engajar mais profundamente com as preocupações reais das pessoas, inovar em suas plataformas e fortalecer suas bases com políticas que ressoem verdadeiramente com as necessidades dos eleitores.

Portanto, se há uma lição a ser tirada do primeiro turno das eleições municipais de 2024, é que a luta política está longe de ser estática. A direita brasileira está em ascensão como nunca antes visto, e se a esquerda deseja mudar esse curso, é crucial que reavalie suas estratégias e se prepare de maneira mais eficaz para os embates diários e futuros. Isso é imprescindível não apenas para as próximas eleições, mas para a construção de um Brasil mais equilibrado e justo para todos.

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Gabriel Barbosa

Jornalista cearense com pós-graduação em Comunicação e Marketing Político. Atualmente, é Diretor do Cafezinho. Teve passagens pelo Grupo de Comunicação 'O Povo', RedeTV! e BandNews FM do Ceará. Instagram: @_gabrielbrb

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Bernardo

11/10/2024 - 15h06

Na equação para a esquerda recuperar há alguns fatores que não dependem dela: a direita assumiu a dianteira usando as midias para aplicar golpes baixos desde 2016, além da sua tradicional falta de escrupulos; o Brasil da direita deixou um passivo que custará ser recuperado na vida sócio econômica do pais; o fator religioso ultraconservador que domina as áreas mais carentes do pais e sob comando das áreas mais ricas. Cabe à esquerda descobrir as frestas nessa barreira e alargá-las sem cair na tentação de usar as armas inescrupulosas da direita.
Isso tufo foi plantado em 2013 e os frutos colhidos a partir de 2016. Mas é preciso ação e menos retórica e Lula é um só. Outros precisam se juntar a ele.

Stalingrado

11/10/2024 - 13h10

Quanto ao comentário do Bandoleiro abaixo, vale lembrar que o Brasil tem a segunda maior taxa de juros do planeta, atrás apenas da Rússia que está em guerra.
A inflação projetada para este ano está dentro da meta, o que não justifica esta faixa de juros.
A Argentina de Milei, com inflação acima de 80% a.a. tem taxa de juros reais inferior à do Brasil. A Turquia, com inflação anual 20 vezes maior que a brasileira, também possui taxa de juros interiores à brasileira .
A Europa, com inflação acumulada de 2.5%, tem taxa de juros de 3,5%.
Ou seja, os juros brasileiros é o modelo Robin Hood ao contrário, tira dos pobres para dar aos ricos.

Stalingrado

11/10/2024 - 12h53

Análise simplista ao tentar colocar a vitória da direita como associado diretamente ao governo Lula. Só para lembrar, o PIB cresceu em 2023 e deve ultrapassar os 3% agora em 2024, com a criação de milhões de empregos, sendo esta a maior taxa de ocupação desde 2014, segundo o IBGE.
O texto reconhece o fato, a força da direita, mas esquece de apontar o trabalho de anos do capital financeiro, meios de comunicação de massas, do poder judiciário controlado pela extrema direita na construção do ódio às agendas progressistas.
O texto não aponta, também, a enorme vantagem da extrema-direita no uso das redes sociais para divulgar fakenews sem serem incomodadas.
Apontar o governo Lula como responsável pela derrota nestas eleições cheira a desonestidade intelectual.

Natalia

11/10/2024 - 12h41

Como assim, eu votei a esquerda porque me diziam que iriam acabar o desmatamento e o desmatamento subiu ? https://imazon.org.br/imprensa/extracao-ilegal-de-madeira-aumentou-19-na-amazonia/#:~:text=A%20%C3%A1rea%20com%20extra%C3%A7%C3%A3o%20ilegal,2022%20e%20julho%20de%202023.

bandoleiro

10/10/2024 - 18h42

“inflação controlada” aonde ? Em qual pais ?

Qualquer tonto que vive do proprio trabalho ou tem uma atividade economica percebe que a inflaçào esta fora do controle ha alguns anos ja e é muito superior a que chamam de “oficial”.

Tanto é que o Banco Central teve que subir novamente os juros diante as asneiras do governo.


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