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O mainstream e as minorias culturais

O Cafezinho tem o prazer de publicar, com exclusividade, mais um artigo de Ana de Hollanda. A PRODUÇÃO MAINSTREAM E AS MINORIAS CULTURAIS Ana de Hollanda, ex-ministra da Cultura Tema bastante controverso e, no entanto, pouco compreendido ou refletido sem reservas é o processo “mainstream” que vem introduzindo no mundo todo uma nova forma de […]

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O Cafezinho tem o prazer de publicar, com exclusividade, mais um artigo de Ana de Hollanda.

A PRODUÇÃO MAINSTREAM E AS MINORIAS CULTURAIS

Ana de Hollanda, ex-ministra da Cultura

Tema bastante controverso e, no entanto, pouco compreendido ou refletido sem reservas é o processo “mainstream” que vem introduzindo no mundo todo uma nova forma de lidar com as indústrias culturais. Lançado há dois anos no Brasil, fruto de cinco anos de pesquisas, “MAINSTREAM – a guerra global das mídias e das culturas”, de autoria do francês Frédéric Martel, é um oportuno estudo sobre o tema, fundamentado em dados relativamente dignos de crédito. Digo dessa forma justamente por se tratar de um assunto extremamente dinâmico e que hoje, considerando a rapidez como se processam mudanças no cenário global, perdeu muito de sua atualidade. Entretanto, dá para se notar que o desenvolvimento da indústria do entretenimento em diversos países dos cinco continentes é realmente surpreendente.

Desconhecido para o brasileiro leigo, que normalmente só tem acesso a produções mainstream dos Estados Unidos ou, eventualmente, de alguma outra região do planeta com o inevitável carimbo norte americano, além, é claro, de nossas populares e bem-sucedidas produções “globais”. Já os profissionais desses setores vêm se reunindo e desenvolvendo transações nas grandes feiras e festivais das indústrias audiovisuais, fonográficas, editoriais, de desenho industrial, de moda, de “games”, entre outras áreas, onde tudo se sabe e tudo se negocia.

Por trás do “soft-power” há uma guerra de conteúdos, de culturas, de idéias, de interesses em que a estrutura do modelo norte americano, sem dúvida alguma, é a cartilha que orienta todos os outros. Estúdios como os da Índia, do Japão, de Hong-Kong, do Catar ou do Mexico desenvolvem uma produção voltada para seus povos, mas também para ser exportada para comunidades cujas culturas seguem linhas semelhantes. Mesmo assim, cada vez mais as companhias norte americanos introduzem sua experiência técnica para co-produções de alta qualidade em que a matéria prima e o consumo sejam locais.

Basicamente o mainstream, seja “blockbusters”, “hits” ou “best-sellers”, busca fórmulas simplificadoras em suas criações, tornando-as acessíveis ao maior número possível de pessoas de distintas culturas. Essas fórmulas traduzem tradições locais subtraindo delas o que poderia causar estranhamento a diferentes povos. A tão aclamada diversidade cultural, dessa maneira, é adaptada ao gosto geral, sem choques. O efeito da absorção geral deve ser rápido e, para que o produto seja captado com facilidade, seu apelo deve se dar muito mais no emocional popular do que em seu racional.

A entrada da Internet nessa guerra de conteúdos é positiva por permitir o acesso à diversidade cultural. Essa diversidade, paradoxalmente, incorpora também o “mainstream”. No leque de conteúdos, tanto a produção doméstica como a independente e a dos grandes estúdios cabem no mundo virtual. Esses últimos oferecem seus produtos ao mundo todo por “streaming” ou “download”, com grande vantagem em relação aos meios tradicionais, por poder abater custos onerosos como os de exportação e distribuição. Chamo atenção ao fato dessas indústrias criativas contarem com uma estrutura profissional que garante o controle dos direitos de suas obras. A disputa que vem se dando no mundo inteiro entre os oligopólios da internet, em especial a biliardária Google, e os detentores de direitos autorais é crucial para a produção de conteúdos. O não pagamento devido de “copyright” ou direitos autorais, como defendem os primeiros, e as garantias legais dessa remuneração, defendida pelos últimos, tem sido o impasse que vem postergando a ampla liberação dos conteúdos.

A questão que se apresenta não é a condenação dessa massificação do entretenimento nem seu endeusamento, uma vez que ela é tão lícita quanto produções de público mais restrito. É inevitável que as indústrias de conteúdo, serviço e produtos culturais invistam mais em quantidade do que em qualidade artística, uma vez que o foco prioritário não é arte, mas cultura de mercado. No entanto, não podemos ignorar um imenso público diferenciado e interessado no acesso à diversidade cultural existente ou em conhecer linguagens novas, supostamente mais herméticas ou elaboradas. Em qualquer segmento artístico ou científico, o investimento em pesquisa de linguagens é o que pode abrir caminho para suas renovações ou reformulações. É bom que as indústrias culturais estejam alertas não só para o público “mainstream” mas também para minorias culturais. Elas podem proporcionar não só o retorno financeiro na medida certa mas, com certeza, abrir horizontes por se encontrar nesse publico diferenciado o gérmen do futuro cultural, até para o “mainstream” do futuro.

 

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Miguel do Rosário

Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.

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