Na última sexta-feira, no Diálogo Shangri-La, em Singapura, o secretário de Defesa, Pete Hegseth, anunciou: “Os Estados Unidos têm orgulho de estar de volta ao Indo-Pacífico — e estamos aqui para ficar.” Logo depois admitiu: “Durante uma geração, ignoramos esta região, distraídos por guerras sem fim, mudanças de regime e construção de nações.” Detalhe curioso: no mesmo período, a Ásia viveu seu ciclo mais tranquilo e rico, enquanto as áreas onde Washington se concentrou — Oriente Médio, Norte da África, Ásia Central — ficaram marcadas por ruínas e déficits.
O secretário apresentou então o novo perigo. Segundo ele, “a China busca tornar-se potência hegemônica” e “a ameaça é real — e pode ser iminente”. A prova seria a ordem para que as forças chinesas estejam prontas, se preciso, até 2027. Para analistas, é apenas uma meta de preparo; para Hegseth, virou contagem regressiva.
Para ilustrar, invocou cenas no Mar do Sul da China: jatos de água contra barcos filipinos, batidas de navios e ilhas artificiais com pistas de pouso. Concluiu: “Qualquer tentativa de mudar o status quo é inaceitável.” A plateia tomou nota, lembrando que grande parte da economia regional depende das mesmas rotas que o secretário promete vigiar.
Veio então a receita: “paz por meio da força”. O orçamento militar dos EUA passará de um trilhão de dólares, comprando submarinos, bombardeiros furtivos e mísseis hipersônicos. E Hegseth foi claro: aliados da região deveriam aplicar 5 % do PIB em defesa. Para quem ainda precisa ampliar rede de esgoto ou salas de aula, a meta pesa.
Quase no mesmo minuto, ele alertou: fazer muito negócio com Pequim criaria dependência. Já comprar armas americanas garantiria autonomia. Inversão que pede fé, não lógica.
O analista francês Bertrand ofereceu um espelho: imagine a China pousando no Canadá e no México, dizendo que “a ameaça americana é iminente”, cobrando 5 % do PIB em armas e prometendo “lutar e vencer”. Seria visto como cooperação ou provocação?
Hegseth listou o pacote de medidas: mísseis na ilha de Luzon, testes de alcance médio na Austrália, produção de munição com a Índia, um consórcio regional de drones. A ideia é “criar dilemas diários” para Pequim — pressão constante que, segundo críticos, transforma incidentes menores em faíscas de verdade.
Depois elogiou a Alemanha por gastar mais com defesa e sugeriu que Japão, Coreia do Sul e Filipinas façam o mesmo. Para arrematar, citou o ataque japonês a Pearl Harbor, a batalha de Iwo Jima e o cemitério americano em Manila como lembretes de sacrifícios que justificam novos cheques. O público asiático ouviu em silêncio.
Fica o dilema: que tipo de paz nasce de ameaças inventadas, discursos paranoicos e rearmamento regional?
O pronunciamento de Hegseth completo está disponível aqui.
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