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Piauí conta a história de como João Doria se tornou candidato e implodiu o ninho tucano em São Paulo

A GUERRA DO CASHMERE Como João Doria Júnior se tornou candidato a prefeito e implodiu o PSDB de São Paulo (Foto: Revista Piauí) por Julia Duailibi, na Revista Piauí O motor da van já estava ligado, e os adesivos espalhados pela lataria preta diziam ACELERA, nas cores azul e amarela. O automóvel, porém, continuava parado na […]

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A GUERRA DO CASHMERE

Como João Doria Júnior se tornou candidato a prefeito e implodiu o PSDB de São Paulo (Foto: Revista Piauí)

por Julia Duailibi, na Revista Piauí

O motor da van já estava ligado, e os adesivos espalhados pela lataria preta diziam ACELERA, nas cores azul e amarela. O automóvel, porém, continuava parado na frente de um casarão no Jardim Europa, bairro residencial onde vive parte da elite paulistana. Seis assessores do apresentador de tevê, publicitário, empresário e – agora – candidato do PSDB à Prefeitura de São Paulo, João Doria Júnior, o aguardavam dentro do veículo que os levaria a compromissos de campanha. “Na frente, é a first. A dog class é lá atrás”, explicou Paulo Mathias, ex-presidente da juventude tucana em São Paulo, sobre a distribuição dos lugares. Às dez da manhã, João Doria Júnior deu um bom-dia geral, sentou-se na first class, ao lado do motorista, trocou algumas palavras sobre o caminho e grudou os olhos no celular. A van acelerou.

Em quinze minutos, chegamos a um encontro com militantes e políticos do PSDB, no auditório de uma faculdade. Doria foi o último a discursar. No palco, à vontade, parecia encarnar ensinamentos de seus livros de autoajuda – Sucesso com EstiloLições para Vencer –, voltados ao universo corporativo. Na prática, o talento para animador de plateias foi forjado durante anos com os eventos do Lide, Grupo de Líderes Empresariais, nos quais Doria costuma atuar como mestre de cerimônias. Nos encontros da associação, fundada por ele em 2003, o empresário e agora político anda para lá e para cá com um apito a tiracolo para orientar a turma do PIB que o prestigia. Diante dos tucanos, porém, dispensava o instrumento. Desenvolto, chamava alguns da plateia pelo nome – e os mais íntimos por diminutivos. Reclamou do baixo quórum feminino e fez o arremate: “Mulheres são capazes.”

“Nós vamos vencer o PT. E varrer o PT da cidade de São Paulo” — João Doria

Em seu discurso, defendeu a união do PSDB nas eleições de outubro e desferiu ataques ao PT, partido do prefeito Fernando Haddad, que tenta a reeleição. Elevando o tom da voz, prometeu: “Nós vamos vencer o PT. E varrer o PT da cidade de São Paulo.” Lançou, então, o grito de guerra: “Vai pra Cuba!” A plateia vibrou, e alguém botou no ar a música Tema da Vitória, usada pela TV Globo no campeonato de Fórmula 1, aquela que acompanhava os pódios de Ayrton Senna. Sob o “tan-tan-tan; tan-tan-tan”, saiu do auditório ovacionado.

Três meses antes do discurso em que defendeu a união do PSDB, o candidato digitou uma mensagem para um grupo de WhatsApp, o Comunica PSDB-SP. À 1h39 da madrugada do dia 30 de março, apertou enter. A mensagem se espalhou por 43 correligionários. “E agora Andrea Matarazzo? Qual será o seu choro? O choro das mentiras. O choro das maldades. O choro dos vinhos. O choro dos charutos. O choro do desprezo pelos pobres. O choro da arrogância. O choro da incapacidade. O choro do Conde. O choro do derrotado.” No dia 20 daquele mês, Doria vencera por W.O. o segundo turno das prévias do PSDB. O seu então adversário, o vereador Andrea Matarazzo, ex-embaixador do Brasil na Itália e ex-ministro da Comunicação Social do governo Fernando Henrique Cardoso, abandonara a disputa em cima da hora. Alegava, entre outras irregularidades, que João Doria Júnior comprara votos da militância tucana e usara a máquina do governo Geraldo Alckmin para cooptar eleitores. Matarazzo contava com dois padrinhos de peso: FHC e o atual chanceler José Serra.

“Não posso acreditar que a ladainha acima seja coisa de tucano. Deplorável!” — Antonio Carlos Pannunzio

A mensagem caiu como bomba no ninho. “Não posso acreditar que a ladainha acima seja coisa de tucano. Deplorável!”, reagiu, ofendido, o prefeito de Sorocaba, Antonio Carlos Pannunzio, pouco antes das sete da manhã. O ex-governador paulista Alberto Goldman, que foi vice de Serra, disparou também para o grupo: “Pannunzio, os tempos são outros. Hoje, o partido comporta ‘grandes empresários e gestores’ que abominam os políticos. Inflados por ambição, dinheiro e suporte do poder público, mostram seu verdadeiro caráter, sem pudor.” Do outro lado, o dono do Lide voltou a acelerar no teclado: “Deplorável é fugir. Deplorável é abandonar o PSDB. Deplorável é ir pro colo do Kassab. Deplorável é ir pra base da Dilma.” De novo, o alvo era Matarazzo, que deixara o PSDB após 27 anos de filiação, tendo como destino o PSD, de Gilberto Kassab, ex-prefeito, ex-ministro das Cidades de Dilma Rousseff e atual ministro da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicação de Michel Temer. Quando anunciou sua decisão, Matarazzo chamou Doria de “senhor feudal” e “capitão do mato”. “Ele é uma piada”, concluiu, em entrevista a jornalistas. Sem adversário no round final das prévias, João Agripino da Costa Doria Júnior, 58 anos, foi aclamado candidato do PSDB com 3 152 votos de um total de 27 mil filiados na cidade.

Por paroquial que possa parecer – e é –, a briga no PSDB paulistano é a expressão da crise que atingiu o partido no último ano. É uma crise de egos, sem dúvida. Ou da precedência de ambições pessoais de suas lideranças sobre um projeto comum, hoje comprometido. Seu ponto de fuga é a sucessão presidencial de 2018. Enquanto o PT era dragado por uma avalanche que misturou denúncias aterradoras de corrupção, a desintegração da economia do país e a inépcia político-administrativa do governo Dilma, o PSDB patinava para se manter como alternativa ao projeto que ruía. Hesitou em apoiar o impeachment, mas depois apoiou. Hesitou em participar do governo Michel Temer, mas depois participou. Ficou a reboque do PMDB e perdeu protagonismo político até para legendas menores, que pareciam estar na rota da extinção, como o DEM.

Das lideranças tucanas, o presidente do partido, senador Aécio Neves (MG), foi quem mais se desgastou. Envolvido em denúncias de corrupção por figurões da construção pesada presos na Lava Jato, seu nome perdeu credibilidade e força no rol dos presidenciáveis. Serra, por sua vez, foi o artífice da adesão dos tucanos a Temer e se recolocou num jogo do qual parecia definitivamente apartado. Assim, a eleição paulistana, importante em qualquer circunstância para o xadrez da política nacional, se transformou num evento crucial para as ambições presidenciais de Alckmin e Serra. A disputa de olho no futuro não deixa de ser, também, uma revanche de 2008, quando Serra, então governador, usou todo seu prestígio para eleger o pupilo Gilberto Kassab, deixando o candidato tucano – o mesmo Geraldo Alckmin que agora tenta se vingar na figura de Doria – fora do segundo turno. A candidata que Serra e Kassab derrotaram naquele ano era a então petista Marta Suplicy, a mesma que agora, no PMDB, se une ao ex-tucano Andrea Matarazzo na disputa paulistana contra o PT e o PSDB.

Num quadro como esse, de frouxidão ideológica e lealdades partidárias praticamente inexistentes, João Doria Júnior ainda assim é visto como um arrivista que furou a fila do PSDB. Para rebater os adversários internos, o candidato costuma citar o cargo de presidente da Paulistur, estatal de turismo, na prefeitura de Mario Covas, ainda nos anos 80, como prova de que seria um tucano de raiz, embora tenha se filiado ao partido só em 2001. Os rivais não deixaram barato. Puxaram sua ficha e descobriram que ele votou em Fernando Collor em 1989, quando Covas também era candidato a presidente. Um assessor da época conta que Covas flagrou Doria com uma camiseta “collorida” ainda no primeiro turno, mas ele jura de pés juntos que só fez o “x” no nome de Collor no segundo turno, quando o adversário era Lula. Aproveitou a polêmica para marcar posição: “Contra Lula, se necessário, voto até no diabo.”

“O nosso projeto político em São Paulo e no Brasil é a eleição de Geraldo Alckmin à Presidência da República” — Márcio França

“O nosso projeto político em São Paulo e no Brasil é a eleição de Geraldo Alckmin à Presidência da República”, prospectou o vice-governador Márcio França, do PSB, quando Doria encerrou sua campanha nas prévias. A morte de Eduardo Campos, num acidente aéreo em 2014, empurrou o PSB, que ele presidia, para o colo de França, fazendo com que Alckmin avançasse algumas casas na corrida interna do PSDB. “Saiu a USP e entrou o Boqueirão”, brincou um tucano sobre o perfil dos aliados de Alckmin, numa referência à praia popular do litoral paulista, base eleitoral de França.

O ex-deputado Arnaldo Madeira, uma das vozes mais críticas do partido que ajudou a fundar em 1988, afirma que Alckmin “tirou do bolso do colete um cara sem militância nenhuma” e agiu “com desprezo” em relação a FHC e Serra. “Ele pensa da seguinte forma: ‘Para mim, importa ter tempo de tevê, não preciso ter aliados políticos. Na tevê, ganho a eleição.’ Ele acha que o Fernando Henrique tem apenas prestígio, e prestígio não dá voto”, afirmou Madeira, durante um café em junho.

Para fazer de seu candidato o campeão de audiência no horário eleitoral, o governador abriu a temporada de loteamento, dando secretarias aos partidos que se juntaram a Doria. Conseguiu amarrar doze legendas à campanha, garantindo ao pupilo o maior tempo de exposição na tela. “O Geraldo mudou muito de comportamento nos últimos anos no sentido de aceitar más companhias”, comentou Madeira.

Continue a ler a reportagem da Revista Piauí aqui

 

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Carlos Querioz Fernandes

08/03/2017 - 20h15

E assim, tomei conhecimento da candidatura de João Dória a Prefeitura de São Paulo, quando
fazia um voo de São Paulo , a Salvador Bahia, até então só o conhecia quando o mesmo tinha
um programa na TV Bandeirantes que sempre que possível assistia e gostava, daí então passei
a acompanhar a sua candidatura da qual achava em princípio não chegar a lugar algum dado
sua posição nas primeiras pesquisas e por não fazer parte do meio político , para minha surpresa
com o tempo sua candidatura ganhou corpo, confesso que foi uma surpresa agradável ver sua
eleição em primeiro turno em São Paulo, caso inédito. Para quem não sabe, seu pai e baiano e
foi um publicitário antes de se eleger Deputado Federal que teve mandato cassado em 1964.

Gringani Crestani

29/09/2016 - 11h47

São Paulo já exporta para o Brasil todo um novo slogan: Bandido bom é aquele que vota no PSDB.

JDB

29/09/2016 - 09h47

Só de dizer que vai varrer o PT, esse câncer do Brasil, já garante o meu voto.


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