O presidente da Coreia do Sul, Lee Jae-myung, eleito em junho como representante de centro-esquerda, iniciou sua política externa com um gesto significativo: uma conversa telefônica com o presidente da China, Xi Jinping, na qual convidou oficialmente o líder chinês para participar da cúpula da APEC, que ocorrerá em novembro, na cidade sul-coreana de Gyeongju. A APEC, sigla para Cooperação Econômica da Ásia-Pacífico, é um fórum multilateral que reúne 21 economias da região com o objetivo de promover o comércio livre, a integração econômica e o desenvolvimento sustentável. Este ano, a Coreia do Sul é anfitriã do encontro, enquanto a China sediará a edição de 2026.
O telefonema, ocorrido apenas seis dias após a posse de Lee, marca uma tentativa explícita de reverter o desgaste bilateral provocado pelo governo anterior e construir uma nova fase na relação entre Seul e Pequim. Segundo o The Korea Herald (Coreia do Sul), Lee e Xi conversaram por 30 minutos em um clima considerado cordial, com ambos destacando a necessidade de “forjar novas relações entre Coreia e China”, aproveitando a mudança de governo em Seul. Lee expressou esperança de que a APEC sirva como plataforma para reforçar a parceria estratégica com Pequim, e enfatizou que a China “é um parceiro importante em todos os aspectos, incluindo a economia e a segurança”.
De acordo com o Global Times (China), Xi destacou que os dois países são “vizinhos próximos que não podem ser afastados” e pediu a elevação da parceria estratégica a um novo patamar. O líder chinês defendeu a expansão dos intercâmbios culturais, o aprofundamento da confiança mútua e o respeito aos interesses centrais de cada país como fundamentos para uma relação mais sólida. Xi também lembrou que, ao longo dos 33 anos de laços diplomáticos, China e Coreia do Sul superaram diferenças ideológicas e construíram uma cooperação multifacetada.
Lee afirmou que deseja promover “trocas ativas em áreas como economia, segurança, cultura e intercâmbio entre os povos”, sempre com base no princípio do benefício mútuo e da igualdade. Além disso, pediu que a China desempenhe um papel construtivo na questão da desnuclearização da Península Coreana. Xi respondeu que a paz e estabilidade na península são do interesse comum de ambos os países e que Pequim contribuirá para avançar nesse sentido.
A economia foi um dos focos centrais da conversa. Em 2024, o comércio bilateral entre China e Coreia do Sul superou os US$ 270 bilhões. Os produtos mais comercializados incluem semicondutores, displays eletrônicos, produtos químicos, automóveis, aço e equipamentos industriais. A Coreia do Sul é uma das maiores fornecedoras globais de chips avançados, com empresas como Samsung e SK Hynix desempenhando papel essencial. Esses componentes são considerados estratégicos na disputa tecnológica global. Washington tem pressionado Seul a aderir a restrições contra a China, dificultando o fornecimento desses chips, o que gerou atritos durante o governo anterior.
Aliás, rumores amplamente discutidos na imprensa sul-coreana sugerem que o ex-presidente Yoon Suk-yeol teria tentado fechar o Congresso após este rejeitar propostas que alinhavam o país às sanções americanas contra Pequim, especialmente no setor tecnológico. Sua política abertamente pró-EUA resultou em deterioração das relações com a China, que agora o novo governo tenta reparar.
A abertura de Lee à diplomacia regional contrasta com a abordagem ideológica de seu antecessor. Xi foi o terceiro líder com quem Lee falou após sua posse — depois de conversas com Donald Trump e com o premiê japonês Shigeru Ishiba. Segundo o The Korea Herald, Lee pretende usar a cúpula do G7 em Alberta, no Canadá, para seus primeiros encontros presenciais com esses líderes.
Apesar da pressão externa e da polarização interna, analistas chineses citados pelo Global Times observam que os laços culturais, a proximidade geográfica e a complementaridade econômica entre China e Coreia do Sul continuam sendo ativos valiosos. Para eles, ainda que persistam desafios, há espaço concreto para cooperação em áreas como comércio, cultura e segurança — especialmente se houver esforço conjunto para restaurar a confiança e conter discursos antagônicos que marcaram o período recente.
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