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Retrospectiva 2017: um ano de Crivella na prefeitura do Rio de Janeiro

Por Theófilo Rodrigues, colunista do Cafezinho Em outubro de 2016, a cosmopolita cidade do Rio de Janeiro elegeu como prefeito o bispo licenciado da Igreja Universal do Reino de Deus, Marcelo Crivella. A vitória foi surpreendente na medida em que venceu, com pouco tempo de televisão e poucas alianças, a poderosa máquina da bem avaliada […]

8 comentários
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Por Theófilo Rodrigues, colunista do Cafezinho

Em outubro de 2016, a cosmopolita cidade do Rio de Janeiro elegeu como prefeito o bispo licenciado da Igreja Universal do Reino de Deus, Marcelo Crivella. A vitória foi surpreendente na medida em que venceu, com pouco tempo de televisão e poucas alianças, a poderosa máquina da bem avaliada gestão de Eduardo Paes do PMDB.

Em poucos dias o ex-senador Crivella completará seu primeiro ano de gestão em um cargo executivo. Mas o que se pode dizer do seu legado construído até agora?

Antes de falarmos exatamente em políticas públicas (policy) precisamos tratar da política e de seus conflitos em jogo (politics).

Uma das principais marcas da gestão Crivella é a sua patente dificuldade em consolidar um sólido arco de alianças políticas. Dificuldade criada pelo próprio prefeito a partir do momento em que optou por não ter como chefe da Casa Civil alguém com experiência articulatória como foi Pedro Paulo nos últimos 8 anos.

Em um primeiro momento, Crivella tentou nomear seu próprio filho como chefe da Casa Civil. Mas a decisão logo teve que ser abortada devido às fortes críticas de nepotismo. Em seu lugar assumiu o ex-assessor de Crivella no Senado, Ailton Cardoso da Silva. Ailton, no entanto, não é conhecido nem por sua capacidade de liderança interna na prefeitura, nem por conhecer os meandros das políticas partidárias.

Destaca-se negativamente ainda a nomeação da ex-vereadora Aspásia Camargo como Subsecretária de Planejamento e Gestão Governamental. Embora possa ser considerada por alguns como uma boa formuladora sobre os temas da cidade, há uma unanimidade entre os funcionários da Casa Civil de que Aspásia não reúne as condições necessárias para um posto de chefia, o que prejudica o processo decisório.

Para suprir os obstáculos impostos pela falta de alianças políticas, Crivella buscou nomes da sociedade civil para compor seu secretariado. Foi o caso de Cesar Benjamin, indicado para a Secretaria de Educação. Conhecido intelectual e editor de livros, Benjamin seria um bom nome para apaziguar o movimento educacional. Ao menos seria se Benjamin não sofresse da mesma dificuldade política de Aspásia Camargo. Incapaz de produzir consensos, Benjamin, ao contrário, trouxe polêmicas desnecessárias para sua pasta. A mais recente foi considerar a questão racial uma “idiotice”, em polêmica aberta contra a atriz Thais Araújo.

Mas se não pôde contar com a “virtú”, ao menos a “fortuna” sorriu para Crivella. Na questão dos transportes estão as principais melhorias, embora não necessariamente derivadas da prefeitura. Por imposição da justiça, o preço das passagens de ônibus na cidade passou de R$ 3,80 para R$ 3,40, para desespero da Rio Ônibus e alegria dos moradores. Além disso, a Câmara de Vereadores aprovou e o prefeito sancionou hoje a lei que proíbe a dupla função de motorista e cobrador na cidade.

Já na esfera de atuação da Secretaria de Cultura foi onde o prefeito conseguiu expressar da melhor forma sua identidade conservadora. Não obstante a bem recebida nomeação de Nilcemar Nogueira, neta de Cartola, o prefeito atuou com mão de ferro sobre importantes tradições da cidade. Não apenas deixou de participar do Carnaval como reduziu o orçamento para a festa. Mas, o que é pior, de forma inédita Crivella estabeleceu a censura no Museu de Arte do Rio e proibiu a exposição Queermuseu – cartografias da diferença na arte brasileira na cidade.

Na saúde a prefeitura também não conseguiu honrar os pagamentos para os médicos das Clínicas da Família o que resultou em greves. Mas a notícia que mais assustou foi mais uma vez uma imposição de censura. De acordo com o Sindicato dos Jornalistas, Crivella teria pedido através de seu assessor de imprensa a demissão de Caio Barbosa do jornal O Dia, pelas críticas feitas ao mau funcionamento dos postos de saúde da prefeitura.

Nas conhecidas subprefeituras, prevaleceram as velhas relações locais que mobilizam interesses na Câmara de Vereadores. Um exemplo mais conhecido é o de Marcelo Maywald, subsecretário da Zona Sul e filho da ex-vereadora Leila do Flamengo. Desde a época do prefeito Cesar Maia que a família comanda a política na região.

Crivella mexeu ainda em um vespeiro para a classe média alta da cidade: o reajuste do IPTU. De fato, entre especialistas havia certo consenso de que o reajuste era uma necessidade já que muitas moradias em áreas nobres estavam isentas. Mas mexer com impostos nunca é tarefa fácil para o executivo. A partir de uma reforma no secretariado, Crivella redistribuiu as secretarias entre aliados e aprovou na Câmara sua proposta. Graças ao apoio dado para a aprovação do novo IPTU, Jorge Fellipe Neto e Pedro Fernandes, neto e filho dos vereadores Jorge Fellipe e Rosa Fernandes, assumiram secretarias na prefeitura.

Entre as críticas que mais encontraram ressonância na opinião pública estiveram aquelas relacionadas às viagens do prefeito. Claro, uma bobagem, mas que conquistou o imaginário popular com a ideia de que o líder da cidade não estaria trabalhando. Crivella viajou, mas por bons motivos. Esteve, por exemplo, na China, em busca de novas linhas de financiamento com juros mais baixos para os cofres da cidade. Caso obtenha sucesso, será um gás para a dinâmica de investimentos no Rio.

Um ano é pouco tempo para qualquer avaliação de políticas públicas. Mas o suficiente para percebermos que no Rio de Crivella falta capacidade de articulação política e sobra conservadorismo e arbitrariedade. Apesar disso, merece elogio a disposição inicial do prefeito em reorganizar as finanças da cidade, seja através do reajuste do IPTU, seja através da busca por novos investimentos vindos da China.

Theófilo Rodrigues é professor do Departamento de Ciência Política da UFRJ.

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Theo Rodrigues

Theo Rodrigues é sociólogo e cientista político.

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Comentários

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ILDO

03/04/2018 - 21h49

A falta de articulação política que vc cita.Não seria não querer nomear político corrupto?

José Esteves

20/12/2017 - 02h42

Faltou mencionar a imprecisão da situação da previdência dos servidores , em declarações o prefeito chegou a afirmar que havia um déficit de 8 bilhões, depois Salomão disse que era de 4 bilhões, alguns meses depois antes de ser exonerado afirmou que a situação da prevrio era superavitária mas má administrada e deveria haver muito mais do que cerca de 150 milhões… Afinal , ninguém sabe a verdade?

Bruno Anastassakis

19/12/2017 - 19h18

Pelo tempo que passa na cidade e no seu gabinete seria de esperar que o prefeito do Rio de Janeiro, o Bispo Marcelo Crivella, não tivesse feito muita coisa. No entanto, enquanto ele anda por aqui, conseguiu fazer as coisas mais absurdas:

– Distribuiu cargos para todas as seitas evangélicas, formando uma aliança política, evangélica, política-evangélica;
– Cortou verba do Carnaval dizendo que o dinheiro ia para as creches, nunca foi;
– Parou com o financiamento público dos movimentos LGBT e da parada do Orgulho Gay;
– Mudou nomes de ruas de favelas para nomes evangélicos;
– Fechou contrato da prefeitura para concessão de crédito consignado aos servidores públicos com um banco que é do tio dele, aquele outro bispo muitas vezes multimilionário.
– Ele nomeou a filha, o sócio da filha, entre outros… e foi obrigado a “desnomear”.
– A Cidade das Artes foi cedida de graça para um festival de cinema cristão, Festival de Cinema Evangélico.
– Interferiu no MAR de forma ridícula, proibindo uma exposição;
– Criou um censo religioso na guarda municipal do Rio de Janeiro;
– Criou mecanismos para que do seu gabinete emane as autorizações para eventos culturais, esportivos e/ou religiosos.

E isso ainda é só o começo do fim porque a Igreja Universal do Reino de Deus ainda vai governar esta cidade por mais três anos.

Mar

18/12/2017 - 21h28

Achei interessante a forma como foi abordado o assunto. Percebe-se a imparcialidade do autor na análise dos fatos, coisa rara nos tempos de hoje.

julio

18/12/2017 - 20h41

theo, para falar desse ano do crivella nao temos que pensar a aliança psol + globo contra o prefeito?

Carlos Henrique Drumond Guimarães

18/12/2017 - 16h21

Ah, coloca um copo de água aí do lado da tv, pra vê se melhora…

Carlos Henrique Drumond Guimarães

18/12/2017 - 16h19

Neopentecostais que desejam o fechamento de escolas, universidades e postos de saúde e hospitais…
Almejando abrir novas igrejas e templos.

Carlos Henrique Drumond Guimarães

18/12/2017 - 16h16

Mostrando a verdadeira face da Universal…
De falsidade, hipocrisia, desrespeito, desprezo, negligência e criminosa.


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