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Uma alternativa de esquerda ao PT, sem frescuras

Por Roberto Ponciano, exclusivo para o Cafezinho Quem apenas ler o título do meu texto, sem se preocupar em ler o artigo, vai espalhar que estou zarpando do PT e me juntando a outros para fundar a mais nova nova nova nova nova nova nova nova nova novidade política da esquerda brasileira. O título do […]

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Por Roberto Ponciano, exclusivo para o Cafezinho

Quem apenas ler o título do meu texto, sem se preocupar em ler o artigo, vai espalhar que estou zarpando do PT e me juntando a outros para fundar a mais nova nova nova nova nova nova nova nova nova novidade política da esquerda brasileira. O título do artigo, em duas partes, é antes de tudo uma provocação, meio dialética dialógica, meio maiêutica socrática. Não tenho nenhuma intenção de deixar o PT, ou de criar alguma alternativa ao partido. Quero apenas discutir ambas as coisas, a frescura de parte da esquerda no século XXI, e efetivamente as alternativas de esquerda e de ruptura ao lulismo e, ou ao PT.

Começando pela frescura, um hipertexto muito chato sobre uma reclamação bem cavalheiresca de Lula, no melhor estilo cavalheiro que Lula (junto com José Dirceu, o mais perseguido dos brasileiros), efetivamente, tem. O que Lula e o PT sofreram, com boa parte não só da militância, mas com as lideranças do PSOL, falar de frescura, é algo bem bonitinho, fofinho, quase um argumento Nutella. Babá e Luciana Genro tripudiaram e comemoram a prisão de Dirceu e a condenação dos PeTistas. Se a direção do PSOL, majoritariamente, se posicionou contra o golpe, setores inteiros do partido foram para a rua pregando o “fora todos”. Objetivamente, pregar o fora todos, num momento de avanço do golpe, é se aliar à elite mais reacionária. Lula absolutamente não disse nada demais. Disse que torce para o PSOL ganhar a eleição do Rio para deixar de frescuras. Objetivamente, foi muito sincero.

Assim como Lula, muitos outros militantes do PT pensam o mesmo. Eu, por exemplo, militei pela vitória de Freixo no segundo turno contra Crivella. Não por uma torcida sórdida, para ver o “circo pegar fogo”, e saber o que o PSOL faria sob pressão. E creio que Lula pensou o mesmo que eu. Seria muito importante para o povo do Rio de Janeiro que o companheiro de lutas Marcelo Freixo derrotasse o fundamentalismo fascista religioso. Que seria uma ótima oportunidade para o PSOL finalmente mostrar ao que veio, depois do fracasso retumbantes das prefeituras de Macapá e de Itaocara, nas quais nenhum dos programas que o PSOL exige das prefeituras PeTistas (como exigiu de Haddad em São Paulo) foram colocadas em prática. Neste sentido, estou com Lula, seria um passo à frente dado pelo PSOL para a maturidade, efetivamente, seria a possibilidade de mostrar como se administra uma cidade multidiversa, a segunda maior do país e a mais conhecida internacionalmente, com o partido sendo minoritário na câmara dos vereadores e oposição aos governos estadual e federal. Sim, administrar uma cidade e um estado não é só ser oposição. Exige uma praticidade e um conhecimento da administração, da coisa pública, do qual o PSOL está longe de ter o traquejo.
Então, entendo o hipertexto de Lula neste sentido. Não só votei no PSOL, no segundo turno militei pela vitória do Freixo, fazendo campanha, colando praguinhas, pedindo votos na rua, no zap, face, etc. Meu desejo era real, assim como considero que o do Lula também é. Ver na prática o PSOL se transformar de pedra em vidraça, e assim, ver o partido pôr em prática algumas das coisas que prega, ou, pelo menos, a militância dele prega, como o passe livre universal. Dito isto, passo à segunda parte do meu texto.

Lula não diz, mas o que está implícito no que ele diz é que o PSOL precisa da maturidade como partido político para realmente ser uma opção, uma alternativa de esquerda no Brasil. Os programas moralistas de “fora todos”, de “todos os corruptos na cadeia” (da UDN pintada de vermelho), depois do sucesso do golpe jurídico-parlamentar-midiático, estão para lá de desmoralizados. Só alguém muito torpe, ou míope, acredita realmente que o “grande problema do Brasil é a corrupção”. Este discurso, que instrumentalizou boa parte da juventude do PSOL, não serve para avançar um palmo na discussão de uma alternativa de esquerda no Brasil. Não por outra razão, o PSOL consegue mais sucesso na juventude dourada de Ipanema do que nos sindicatos de trabalhadores, ou nas favelas e subúrbios. O problema do Brasil não é moral. Os problemas do Brasil são estruturais. E são muito mais profundos que petições de princípios ou ismos preguiçosos para “analisar” questões sem sequer conhecê-las.

A tradição de esquerda brasileira tem vários problemas. Nélson Werneck Sodré dizia que uma delas é que nosso proletariado era no máximo de segunda geração, que não tínhamos uma tradição de formação operária, ou de densidade ideológica nos partidos políticos. Não que o PT seja denso ideologicamente, mas é síntese de uma série de movimentos multifacéticos que convergem numa forma partido única: a intelectualidade de esquerda revolucionária ou social-democrata não agrupada dentro do PCB, os movimentos guerrilheiros de esquerda, as comunidades eclesiais de base, os movimentos do novo sindicalismo das décadas de 70 e 80, agrupados numa forma-partido. Esta mistura multifacética criou um partido com forte enraizamento, ainda hoje, em vários segmentos, como o operário (através da CUT); dentro da igreja católica; dos movimentos de trabalhadores sem-terra e de pequenos agricultores. O resultado desta convergência de tantas forças e fatores, dentro de uma única organização, ao contrário do que muita gente diz, ainda não necrosou. Tanto assim é que os muitos rachas e refundações do PT acabaram por reproduzir os defeitos do PT sem reproduzir suas qualidades.

O PSOL tem praticamente quase todas as correntes do PT dentro do seu seio, com nomes mudados, é um microcosmo PeTista com outro nome e se pretendendo mais à esquerda, muito mais por um programa moralista do que por uma alternativa real de ruptura socialista. Partidos políticos não se formam e se tornam gigantescos movimentos de massa por ideias de meia dúzia de intelectuais acadêmicos, ou de estudantes de extrema esquerda radicais. Nunca crescem ou ganham densidade por petições de princípios de “estar mais à esquerda” ou “serem mais revolucionários”. Partidos são necessidades históricos e representações de grupamentos e ideias da sociedade, não são o que almejam ser, são o que são na práxis. Não por outra razão, na América Latina, praticamente em todas as minas de carvão, prata ou ouro, nasceu um Partido Comunista. A superexploração leva à reação mais violenta e radical. As várias “refundações” do PT, do PC do B, do PCB, os vários rachas criados “mais à esquerda”, as novas formas partido que vão surgindo aos montes como a UP, no fundo são antropomorfizações de desejos de se “retornar à raiz mais pura do movimento operário”. Esta retorno à raiz mais pura não tem nada de revolucionário ou marxista, é uma mistura de sentimentos românticos decadentes, que, em resposta à nossa falta de organização, apela para opções irreais e oníricas, que nunca são confirmadas na prática. Os novos e pequenos partidos de “raiz revolucionária”, 100% das vezes, se tornam opções pseudo-acadêmicas ultrarradicais no discurso, mas sem base operária e popular.

A convergência de fatores que criou o PT no fim da década de 70 e início dos anos 80:

1) As fortíssimas greves operárias e a criação de um novo sindicalismo de oposição ao velho organismo sindical burocrático oficial (quando a classe operária tinha mais de 30% da mão de obra formal no Brasil, hoje mal chega a 14%, os ideólogos da crise de direção no sindicalismo nunca analisaram a terceira Revolução Industrial);
2) A resistência dentro da igreja católica e a formação das comunidades eclesiais de base, a partir da teologia da libertação;
3) A resistência armada, a partir, em sua maior parte, da esquerda não organizada dentro do PCB, ou de rachas do Partidão, antes o maior partido de esquerda no Brasil. O fim do monopólio e da hegemonia de esquerda pelo PCB e a disseminação de muitos grupos de esquerda e guerrilheiros, que depois se organizarão, a grande maioria, dentro do PT;
4) A reunião de uma intelectualidade socialista revolucionária, ou social-democrata, fora da influência do PCB, e sua convergência para o PT.

Esta série de fatores históricos não podem ser criados em laboratório, ou em decisões de grupos minoritários, ou a partir de cisões de correntes dentro do PT. Não por outra razão, o PSTU se tornou um partido de discurso radical e de prática sectária e sem ressonância na base, cujas bases sindicais, organizadas dentro da CSP-Conlutas, nunca conseguiram chegar nem a 3% da mão de obra formal no Brasil, e que possui mais sindicatos de servidores públicos da classe média, que de trabalhadores operários e proletários. O PSOL, por sua vez, consegue alguma ressonância na classe média, mais radicalizada no discurso, e nos setores estudantis (não de todo o Brasil, o PSOL é o mais carioca de todos os partidos brasileiros, é forçoso reconhecer). Apesar do discurso radical de setores, praticamente inexiste no movimento sindical e operário. Há militantes do PSOL no movimento sindical e operário, mas o PSOL nunca conseguiu se organizar como uma alternativa palpável nacional no movimento dos trabalhadores.

Assim, se pensar em uma “alternativa de esquerda ao PT”, sem frescuras, ou seja, sem moralismo, mas que seja efetivamente alternativa de poder, não pode prescindir da análise acima. O PC do B é maior e mais representativo do que o PSOL, mas, em que pese o nome de comunista na sigla, na política, a estratégia de luta do PC do B não vai muito além do desenvolvimentismo, da defesa de um projeto de autônomo de nação, o que não o diferencia absolutamente nada do PT, e o que faz disputar o mesmo nicho, ao mesmo tempo em que é seu maior aliado. Aliados e rivais nas urnas, efetivamente o PC do B não se apresenta de forma objetiva como uma alternativa de esquerda ao PT.

A história não se faz a partir dos desejos. Na resposta ao que Lula disse, o que vi, em usa maioria foi “mais frescura” na resposta de quem replicou Lula. E vou explicar o que chamo de “frescura”. Frescura é dizer que o PT se perdeu, que fez alianças que o descaracterizaram, dizer que o PT esqueceu o programa de sua fundação, que o PSOL resgata esta essência; ou que o PSOL não se envolve com corrupção ou queixumes morais parecidos. Isto está longe de entrar no cerne da questão. A volta às raízes nada mais é do que um desejo, um queixume e uma forma de esconder a falta de um programa real para enfrentar a grave crise política que estamos enfrentando agora, com um golpe de Estado com características cada vez mais protofascistas. Alguns amigos meus do PSOL, a quem considero muito (o PSOL é meu adversário político, não meu inimigo de classe, pode e deve ser aliado tático e estratégico), disseram que uma das piores coisas do golpe foi exacerbar o “lulismo acrítico”. Eu quase chego a concordar com eles. Depende do que eles chamam de Lulismo. Se eles chamam de lulismo um certo culto à personalidade de Lula, a ideia de que Lula seja infalível, então, concordamos. Me incomoda este tipo de comportamento de alguns petistas.

Mas, se pegarmos a definição de André Singer e de Gilberto Maringoni de Lulismo, não como um culto à personalidade de Lula, mas como um processo político em que o nome de Lula transcende os limites do PT, e é capaz de unir alguns setores da classe média e até da elite, em nome de um determinado projeto de país, creio que a crítica deste lulismo ainda está para ser feita. A preguiça de pensar, ainda mais agora, com a moda da “filosofia auto-ajuda” de Karnal e Cortella, serve inclusive para que parte da esquerda responda a tudo com um chavão, com um ismo e nem precise fazer a crítica. União Soviética? Análise? Nada, basta falar “stalinismo”! Aí você simplesmente deixa de tentar entender o mais importante processo sociometabólico do século XX, a Revolução Russa, e espanta com um pequeno ismo seu estudo. Um ismo, que dependendo da boca de quem sai, deixa de estudar 35 (1921-1956) ou 70 (1921-1991) anos da história russa. Aliás, o ismo stalinismo é usado até hoje para crítica à autoridade, como se toda autoridade e hierarquia fossem ruins. O que prova, desde início, que, quem usa este ismo para tudo, nunca leu Marx. O rotular para não debater é a chave de certas “intelectualidades”. Assim, pode se agrupar no chavão “populismo” coisas tão diversas como o Brasil de Vargas, à Argentina de Perón; o Peru de Velasco Alvarado, e, dependendo de quem estiver usando o ismo “populismo”, até o Brasil de Lula, a Argentina de Kirchner, a Bolívia de Evo, ou que vier pela frente. É o contrário do estudo de caso e a tentativa de entender o processo, como fez Celso Furtado, que, por exemplo, para fazer o estudo de caso da Venezuela, esteve no país para compreender suas idiossincrasias, então escreveu ensaios só sobre as características próprias do país, reunidos no livro “Ensaios sobre a Venezuela, subdesenvolvimento com abundância de divisas”. As categorias políticas e filosóficas servem como método para abordar, entender e estudar, não como bengalas para fugir da análise minuciosa e do estudo acurado de caso.

Parte da esquerda brasileira se acostumou com as petições de princípio e com as soluções messiânicas para qualquer problema. Vou dar dois exemplos. Uma é a auditoria soberana da dívida. Com certeza acabei de arrumar um problema para a eternidade. “Ponciano, você é contra a auditoria soberana da dívida e contra o não pagamento?” – já gritam, arrancando os cabelos com s mãos e me ameaçando com pedras, aqueles que vem a auditoria soberana como panaceia e como solução para todos os problemas estruturais do Brasil. Lembro que a ONG que defende, com simplismo, esta solução faz do Equador, ou melhor, do default do Equador no pagamento da dívida um caso de sucesso. É lógico que todos de esquerda sabem que a dívida externa é um mecanismo de extorsão, de empobrecimento e de subjugar os povos. Mas a questão não é só a dívida, a questão inclusive é bem outra, e de Real Politik, como pode um Estado sem grandes recursos, sem poupança interna, sem tecnologia de ponta, financiar de forma sustentável seu desenvolvimento. E o Equador, ao contrário do que se diz, não é um caso de sucesso. Defendemos nosso camarada Rafael Correa, mas o que ele fez, ao lado da propaganda política da renegociação soberana, foi, num Estado endividado e falido, negociar moeda podre por seu preço nominal. Assim, a redução em 50% da dívida equatoriana, se, de um lado, deu condições a que o Estado equatoriano normalizasse suas finanças e sim, tivesse condições não só de se refinanciar, ou seja, de se reendividar de novo; de outro lado, transformou moeda podre, praticamente não comercializável mais no mercado internacional de capitais, em dívida do Estado assegurada. O Equador conseguiu sair da crise, mas não totalmente, neste default o Equador perdeu e não recuperou sua moeda, ou seja, o Equador não tem como fazer política desenvolvimentista de câmbio, pois continua sem moeda própria (sim, o povo da auditoria cidadã da dívida sempre esquece de dizer que seu “case de sucesso”, o Equador, tem como moeda interna o dólar americano), e com isto tem que efetivamente, de todas as formas, exportar em quantidade colossais, sempre, café, cacau e petróleo, para conseguir efetivo para que a economia funcione.

Longe de ser um case de sucesso, o companheiro Rafael Correa, que defendemos com unhas e dentes, continua preso à lógica da exportação de commodities. A panaceia da “negociação soberana da dívida”, usada como se a negociação soberana não fosse uma questão de força político e econômica de um Estado, de seu PIB, dos produtos que produzem, e até de sua força militar, mostrou como é apenas uma panaceia. Quando tentou ser aplicado na Grécia e no Syriza, que se transformou, para muitos, naquilo que “o PT deveria ser e nunca foi”, mostrou seus limites. Das propagandas iniciais da negociação soberana e unilateral da dívida (de um país pouco industrializado, com PIB per capita baixo para a Europa, e sumamente dependente dos bancos alemãos), à frustração em poucos meses da euforia, face à real politik, o Syriza sumiu do mapa da extrema-esquerda, sem que se fizesse nenhuma auto-crítica dos elogios retumbantes ao partido que faria uma política soberana, “ao contrário do PT no Brasil”, assim como nunca foi feita a auto-crítica da “Primavera Árabe”, que eles alardeavam como início da “grande revolução mundial”.

Analisar o esgotamento do Lulismo, é analisar efetivamente se temos alternativas outras para sair da crise política e do golpe que não seja a candidatura de Lula em 2018. Não sou personalista, Lula não é um caudilho, nem um herói. Mas sou gramsciano, ouso classificar Lula como o “intelectual orgânico”, que, mesmo sem ser um acadêmico, sintetiza o programa político de resistência e as expectativas e esperanças do povo brasileiro. E uso a palavra povo e não a palavra massa, porque a uso como categoria, não só o proletariado, mas os setores progressistas de uma nação, aí considerados o proletariado, a parte da classe média que não se aliou com o golpe, e até setores muito pequenos da elite que possam convergir para um processo de derrotar esta hegemonia do rentismo. Não sou daqueles intelectuais desencantados do canto do “não há alternativa”, mas como marxista, e assim, adepto de que a realidade não advém da minha cabeça, mas é reflexo das contradições reais e concretas da sociedade, não pretendo inventar alternativas irreais diante de um quadro gravíssimo de avanço da direita. O golpe que foi dado no Brasil não foi dado contra o PT. O PT sempre foi o dique que barrava o avanço dos programas mais nefastos de uma elite, colonialista em sua formação, interesse e composição. O dique arrebentado, avisávamos, a torrente levaria tudo, a resistência da esquerda, os direitos dos trabalhos, a previdência, o direito dos servidores públicos, as últimas empresas estatais. Não precisa ser gênio da raça para isto, precisa apenas somar dois mais dois.

As “alternativas de esquerda” ao lulismo, visto aqui como um processo de convergência de forças políticas que transcendam o PT, num programa mínimo de resistência ao tremendo retrocesso que as elites impuseram através do golpe, INEXISTE. Sim, concordamos com a crítica de Maringoni e Singer, que um determinado tipo de compromisso do lulismo, com uma parte da elite brasileira que ganhou com as políticas de Lula, de crescimento do mercado de consumo e de fomento às empresas nacionais, realmente não é mais possível. O que não leva a um outro passo de ruptura revolucionário, até porque, a correlação de forças não aponta de nenhuma maneira para isto, pelo contrário, coloca a tarefa de derrotar esta mesma elite nas urnas, como uma tarefa mais complexa e difícil, ainda dentro dos marcos do “lulismo” (como sempre, aqui visto na categoria defendida por ambos). A elite não deu o golpe para devolver o poder para a esquerda. Vai tentar aprofundar e acelerar o golpe, para continuar a fazer suas reformas, que me recuso a chamar pelo nome de reformas, a fazer a retirada de direitos.

Uma elite cuja estruturação, desde o início, desde a independência (quando o Brasil foi o único caso do mundo com um império cuja sede se trasladou da metrópole à colônia mais rica), sempre se confundiram e se mesclaram ao da banca inglesa, depois substituída pelo imperialismo estadounidense. Cuja industrialização foi feita de forma dependente e subsidiária a da penetração das grandes empresas transnacionais no Brasil. A elite colonialista brasileira não tem um projeto de nação. Vive voltada para o mar, de costas para o próprio Brasil, é uma elite de gusanitos de Miami. A demonstração mais cabal disto, é que a retirada de direitos e o império do rentismo, inaugurados pelo golpe, corroeram a base real produtiva da economia, e até o rentismo teve seu lucro reduzido, porque, como mostrava Marx, sempre Marx, os juros, ao fim e ao cabo, tem que ser confirmados em algum lugar da economia real. O ciclo vicioso inaugurado pelo golpe está transformando em pó a economia brasileira, talvez por isto, o firme apoio de Aécio ao golpe.

Sim, o PT não é eterno, Lula não é eterno, sequer nós, caro leitor que me lê, ou eu que escrevo estas linhas somos eternos. Como ateu, acredito que em breve viraremos pó. Mas efetivamente as coisas que viram pó, “tudo que existe desmancha no ar”, só são superadas dialeticamente, por uma contradição que carrega em si a tese anterior, uma antítese que tem como base real o que foi estruturado antes. Não haveria PT, como é hoje, sem que o PCB tivesse criado e alicerçado um forte movimento de esquerda e operário no Brasil. Pode-se estudar o PT como a superação dialética do PCB como alternativa de esquerda no Brasil. O fato é que a alternativa de esquerda ao PT, como movimento de massa e organização política real, como alternativa de poder, neste momento inexiste.
Então, tirando a frescura do discurso moralista, o que temos para enfrentar a elite em 2018 é sim o camarada Luís Inácio Lula da Silva. A possibilidade de garantir minimamente primeiro que haja eleições, que não se dê mais um golpe e que seja garantido o pleito de 2018. A elite, com certeza, tentará artifícios como o voto distrital, o parlamentarismo, ou até uma prorrogação ilegal de mandatos. Não duvide de nada, os setores que estão no golpe, a mídia, o Judiciário, a Polícia Federal, toda a elite corrupta do Brasil, são capazes de tudo para manter o poder. Só um forte movimento de massas garantirá as eleições sem mudança de regras em 2018.

Em segundo lugar, tentarão de todas as formas tornar Lula inelegível. Lula é o candidato que derrotará qualquer alternativa da elite em 2018. Bolsonazi, Blablarina, Dória Gray, nada nem ninguém é páreo para Lula 2018. Então, de um lado a elite fará de tudo para não ter eleições, de um lado, de outro lado fará tudo para que Lula não a dispute, ou não tome posse. Alternativa de esquerda no momento, em que a elite diz claramente que a democracia faz muito mal a seus interesses, é garantir as eleições em 2018, e garantir que Lula seja o candidato do setor democrático e popular que resiste ao golpe e à retirada de direitos, com um programa, até pela nova correlação de forças, mais avançado e ousado que das vezes anteriores. Garantir que se candidate, vença e tome posse.

No futuro podemos construir, a partir da realidade, alguma alternativa que avance a luta da classe trabalhadora do Brasil, além dos limites do capitalismo, é claro. Mas o exercício sobre isto, nas atuais condições de CNTP, dentro de um golpe da elite, com a dimensão em que foi dado, com o recuou a que a elite nos submeteu, com a correlação de forças que temos hoje, é apenas um delírio. Revolucionários não vivem de delírios, revolucionários constroem sobre a realidade.Temos a certeza que a alternativa única é Lula 2018. Nossa tarefa: garantir as eleições, a posse e depois o programa mínimo de resistência popular e de reconstrução do país com Lula.

Roberto Ponciano, que vive no Rio de Janeiro, é escritor e filósofo e dirigente sindical.

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Miguel do Rosário

Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.

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ALICE DAFLON GOMES FRAIZ

31/07/2017 - 10h25

Concordo de cabo a rabo com o artigo. Acho o PSOL um partido bem intencionado, mas totalmente equivocado, e tem levado boa parte da energia e disposição de luta da juventude para uma canoa furada. O PSOL, inclusive, por causa do seu discurso moralista anticorrupção, desdenhou o apoio do PT e do PCdoB nas eleições de segundo turno no Rio. Ainda não entendeu a gravidade da conjuntura e, por querer ter um protagonismo próprio no momento histórico que estamos vivendo, está perdendo o bonde da História e não está tendo protagonismo nenhum.

Flávio Duarte

29/07/2017 - 09h14

E o Ciro Gomes? Não pode ser citado?

Ele foi decisivo para a manutenção do Lula no poder naquela tentativa de golpe em 2005, apoiou o Lula e Dilma em 2010, 2014, 2016, apesar de ser traído por ambos e pelo Eduardo Campos.

Não vejo candidato mais apaixonado pelo Brasil do que o Ciro Gomes. Isso sem falar do preparo dele. A história do PDT de Brizola é linda.

ari

28/07/2017 - 19h12

Artigo para reler com mais calma e meditar.
Apenas uma questão: O “fora todos” não é do PSTU?

GusVSZ

28/07/2017 - 16h58

De acordo

vera lucia mello nunes nunes

28/07/2017 - 16h45

li QUASE INTEGRALMENTE , NÃO SOU HIPÓCRITA DE DIZER LI TUDO ,MAIS VOU TERMINAR DE LER . HOJE MESMO, TERMINANDO AQUI DE ME PRONUNCIAR VOU LER. ADOREI O POUCO QUE LI ISSO E TUDO QUE PENSO.

Alexandre Cesar Costa Teixeira

28/07/2017 - 15h35

Caro Roberto Ponciano, li atentamente seu artigo e gostaria imensamente de ler um breve aprofundamento seu acerca do que registras no 11 parágrafo: …“filosofia auto-ajuda” de Karnal e Cortella …
Por qual fundamento você iguala o Cortella ao Karnal
Antecipadamente agradeço

Marcelo

28/07/2017 - 15h35

Ótima análise! Seria deselegante, desmerecedor e improdutivo pontuar tudo e responder com “textão” (o seu já basta). Agora, penso que ficou claro, nas entrelinhas, que o PT tem que contribuir, abrindo mão de um projeto unicamente de “poder” e partir para o tal projeto de “nação” (sem o ranço de nacionalismo – olha o “ismo” aí). Me desculpe, mas conheci os aulicos do PT desde 1980 e eles de certa forma corroboram o culto à persona, não como tática, mas como fim.
É difícil largar o osso é essa galera não só extirpou muita gente boa, como, diariamente, sabota gente nova. Partido novo também é resposta a isso, à falta de debate interno, à destruição de instrumentos de controle social que, numa organização de esquerda, é essencial, tanto quanto pedagógico. Falo mais depois.

Adelino Ferraz

28/07/2017 - 15h18

Tem que manter isso… Viu?

Augusto Carlos M. Moraes

28/07/2017 - 15h03

Nossa!
Nunca li tanta besteira junta…
Não seria hora de aceitarmos os erros e realmente reformular o partido?
isso que o sr. escreveu só serve para afundarmos ainda mais… As eleições passadas são a maior prova disso.

Túlio Ribeiro

28/07/2017 - 14h56

Ponciano quanta clareza,conhecimento e didática na explicação.
Ponciano conhece muito e mira longe!
Parabéns!


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