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Intervenção militar no Rio une irresponsabilidade do governo ao mau caratismo da imprensa

(Ocupação militar de favelas em 2017. Foto: Marcos de Paula/AE) Para uma coisa serve a intervenção militar no Rio de Janeiro: para unir a irresponsabilidade e o desespero do governo Temer, cuja impopularidade, em ano eleitoral, começa a incomodar sua base política, e o mau caratismo da imprensa, que, com o desgaste da Lava Jato […]

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(Ocupação militar de favelas em 2017. Foto: Marcos de Paula/AE)

Para uma coisa serve a intervenção militar no Rio de Janeiro: para unir a irresponsabilidade e o desespero do governo Temer, cuja impopularidade, em ano eleitoral, começa a incomodar sua base política, e o mau caratismo da imprensa, que, com o desgaste da Lava Jato já aparecendo nas pesquisas (Moro já tem rejeição de político), precisa encontrar um novo instrumento de manipulação da opinião pública.

Em sua longa (e bizarra) entrevista ao Correio Braziliense, na qual enquadrou o problema da segurança pública numa perspectiva puramente militar (guerra de 1945, guerra ao terrorismo), o ministro da Justiça, Torquato Jardim, entregou o jogo.

(O ato da intervenção) foi pensado durante semanas, conversado, apenas em um círculo íntimo do presidente da República, do qual sempre participou o ministro da Defesa. Portanto, as Forças Armadas estavam cientes do que se passava. Não é uma decisão que você anuncie em praça pública, no coreto. Isso não existe. Conforme se consolidavam as ideias, outros foram participando, passamos ao quadro político, ao jurídico, ao econômico e ao financeiro. Aí vieram os ministros Henrique Meirelles e Dyogo Oliveira, conversamos sobre a produção de mercado porque a intervenção suspende a votação e o processo legislativo. Então, era preciso saber das questões econômicas e financeiras quais as consequências para o mercado, para investidores. Depois, pesquisas de opinião, qual é a percepção se não passa a Previdência agora.

Ou seja, se foi pensada “durante semanas”, não foi o Carnaval que deflagrou a decisão. Observe ainda que a segurança propriamente dita da população fluminense foi a última das preocupações do governo. Em primeiro lugar veio o “mercado”. Como iriam reagir as bolsas. O internauta não deve se esquecer que o “mercado” festeja golpes, ditaduras e guerras, desde que estes movimentos sejam controlados pelas mesmas forças que controlam o mercado, a saber, o grande capital internacional.

O cuidado com os mercados foi premiado. O índice Ibovespa realmente se valorizou na última semana.

Naturalmente, o apoio da Globo à intervenção era fundamental. Temer não seria louco de fazer nada que produzisse atritos com seus “chefes”. Até porque, sem apoio da Globo, a decisão não resistiria judicialmente, em virtude do controle político da família Marinho sobre o STF, estabelecido desde a Ação Penal 470, e construído sob o olhar apatetado, beirando o catatônico, dos governos petistas.

À diferença dos estereótipos que se lançam contra a esquerda, esta nunca teve uma visão romântica da violência pública, nem aqui nem qualquer outro lugar do mundo. O que setores progressistas, no Brasil e em qualquer parte onde o problema seja estudado cientificamente, é dar um tratamento racional e objetivo à questão.

A professora Jaqueline Muniz, especialista em segurança pública, por exemplo, aponta para contradições evidentes na iniciativa: por que não houve, e não há até agora, investimento na capacidade investigativa da polícia civil?

Jornalistas não comprometidos com o governo Temer, por sua vez, perguntam-se porque o Rio foi escolhido, se a cidade não está sequer entre as 30 com maior problema de violência?

É de se notar que tudo não passa de um grande factoide para satisfazer – e manipular, mais uma vez – a classe média paneleira, o mesmo setor que apoiou e sustentou tanto o golpe de 1964 quanto o de 2016: afinal, não era isso que se pedia nas ruas, que houvesse “intervenção militar” no Brasil?

O que houve no Rio que poderia ter motivado a intervenção? Apesar da segurança sempre ter sido um problema terrível vivido pela população fluminense, sobretudo na região metropolitana, a questão mais premente tem sido o desemprego, de um lado, e o desmonte do Estado, resultando em piora súbita, dramática, dos serviços públicos, em especial na área da saúde, limpeza e saneamento.

A destruição dos setores industriais mais dinâmicos do estado, pela Lava Jato, teve como consequência, por sua vez, uma queda drástica na arrecadação fiscal do governo. Com o avanço da Lava Jato sobre o setor de transportes, bloqueando bens, prendendo, paralisando empresas, o problema fiscal agravou-se ainda mais. O BNDES não financia mais nada. O BB fechou centenas de agências. A burocracia, que sempre foi infernal no país, aumentou desmesuradamente após a Lava Jato, em função do terror infundido no funcionalismo público (eu falo isso de cadeira: houve um aumento absurdo e idiota na burocracia necessária para se receber dinheiro do exterior – blogs costumam receber sempre alguma coisa de publicidade de empresas sediadas lá fora, como o Google).

Como um governo preocupado com a segurança pública atrasa salários dos policiais e sucateia a polícia civil?

Como um governo preocupado com a segurança pública ignora todos os fóruns ligados ao tema, que contam com a participação de centenas de pessoas e entidades, e parte para uma aventura solitária, que não respeita o conhecimento construído ao longo de décadas de luta contra a corrupção policial e a violência?

É óbvio que a intervenção militar no Rio explica-se somente como uma ação eleitoreira, visando o alívio – de curto prazo – puramente psicológico e midiático dos setores mais amedrontados da população fluminense.

O apoio da Globo à intervenção, desde o primeiro momento, com direito a uma comparação, feita por Merval Pereira, com a ação do exército brasileiro no Haiti, é coerente com a participação da família Marinho na articulação e na sustentação do golpe de 2016.

O poder da Globo sobre a opinião pública fluminense vai além da imaginação de George Orwell, autor de 1984. Não há um bar no Rio que não tenha uma ou mais tvs ligadas o tempo inteiro na emissora. Os casos de violência são tratados com sensacionalismo, assim como a entrada triunfal das tropas no estado é descrita com pompa digna de um grupo que se consolidou à sombra do regime militar.

O mau caratismo da mídia brasileira, no entanto, ao abordar a questão da violência, não poderia ser maior, sobretudo porque ela asfixia qualquer debate minimamente plural sobre o tema. Em sua histeria antipobre, a mídia brasileira impõe, voluntariamente ou não, uma visão de Estado puramente policialesca, o que, num certo sentido, é pior que o fascismo, visto que este ao menos tinha uma preocupação com o nível de emprego.

Assim a Globo cria o pior dos mundos para o Rio e para o Brasil: um estado policialesco onde a própria polícia é sucateada e no qual, portanto, um exército completamente despreparado para tal cuida da segurança pública, o que é um caso único no mundo.

O que chama mais atenção é que, para a Globo e a classe média manipulada, a violência que mais parece incomodar não são os crimes contra a vida humana, que bateram recorde no ano do golpe, em 2016, e sim os roubos de celulares.

E foi exatamente o que houve no Carnaval do Rio, um grande e previsível arrastão de celulares. Com 3 milhões de foliões nas ruas, incluindo a juventude rica do país inteiro que aqui veio fazer a festa, num estado cujos adolescentes e jovens vivem um período terrível de desesperança e falta de perspectivas, não foi surpresa que o número de furtos e assaltos tenha crescido dramaticamente.

O problema foi agravado pela total falta de planejamento de segurança e transporte por parte tanto do governo do estado quanto da prefeitura.

Parece até que foi de propósito…

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Miguel do Rosário

Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.

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Comentários

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M. Lima

24/02/2018 - 12h09

O Michel Temer não toma nenhuma decisão sem ler pela manhã o editorial do dia do jornal O Globo (essa é uma verdade que eu apurei de uma fonte que trabalha no planalto!). Dito isto, a “intervenção” no Rio foi um pedido da Família Marinho (nada a ver com uma “cortina da fumaça” pela derrota da reforma da previdência, embora tenha servido para isso também). A verdadeira razão, VERDADEIRA E ÚNICA, por trás desta intervenção terrível, é porque os marinho, irão pressionar fortemente nos próximos dias as instituições e juízes para prender o Lula. Os Marinhos estão obcecados: eles querem a “cabeça de Lula numa bandeja” para mostrar ao povo. E assim, sugerir ao povo brasileiro o seguinte: “Eis aqui o seu Rei (o Lula)! Ele não é maior do que eu. Eu que Mando nesta merda deste país” (lembra até um passagem bíblica com Pilatos né, mas a intenção é a mesma). Não subestime. Agora vamos falar da intervenção… Os Marinho, donos do Jornal o Globo, ciente de que a prisão de Lula vai causar um estopim no país, principalmente no Rio, eles ANTECIPADAMENTE pediram ao Temer para botar o Exército nas ruas e intimidar o povo pobre a não irem para a luta pelos seus direitos. O medo dos marinho é que, sabendo eles, que Lula preso (de forma espetaculosa) o povo se voltaria contra a Globo. Poderiam depredar seus prédios, atacar seus jornalistas/funcionários na rua e até invadir as mansões dos Marinho e tentar agredi-los e atacá-los. O que, todos sabemos, é merecido, mas seriam pela revolta da população (“o morro vai descer”). Então, para se proteger dos ataques do povo irado com tanta injustiça e ao mesmo tempo mostrar que manda no país, a Globo e não Temer (que é só um pau mandado!)) botou o Exercito na Rua para se prevenir dos ataques. A população, evidentemente, sendo intimidada em sua própria casa, não teria gás para se manisfestar contra o arbítrio e as injustiças da Família Marinho.

Não subestime o que falo aqui, falo com propriedade. O maior medo dos Marinhos é uma revolta do povo contra suas empresas. Eles sabem, conscientemente, que estão “fudendo com o povo pobre do Rio” e tem medo da retaliação do povo.

Alteclinio Martins

24/02/2018 - 07h56

E foi proposital o abandono da segurança no Carnaval para justificar a intervenção militar.

Boin

24/02/2018 - 00h55

O exército faz lavagem cerebral nos soldadinhos.

Essas ações são para gerar matérias nos jornais e desviar a atenção dda robalheira do PSDB e PMDB.

C N Morais

23/02/2018 - 17h48

“…O poder da Globo sobre a opinião pública fluminense vai além da imaginação de George Orwell, autor de 1984. Não há um bar no Rio que não tenha uma ou mais tvs ligadas o tempo inteiro na emissora”. Não só no Rio, e não só em São Paulo, onde moro. Bares, restaurantes, lojinhas, consultórios, mesmo repartições públicas – TODAS as TVs nesses locais estão sintonizadas na Globo. É um holocausto informativo, não se trata apenas de monopólio, é Sindrome de Estocolmo. Está na hora de começarmos uma campanha para banir a Globo de lugares públicos, ou jamais sairemos desse pesadelo.

    Elaina Barboza

    24/02/2018 - 07h48

    Concordo plenamente com o senhor. A Globo está ditando comportamentos e regras para denegrir a família o tempo todo! Está entrando na vida dos outros sem o mínimo respeito que nós merecemos. Está banalizando tudo!!! E as pessoas de cabeça fraca caem nessa onda…onda de nojo! Se a Globo continuar a ser o imperialismo no Brasil, realmente, vai acabar com o povo decente que resta…foi-se o tempo do respeito pelas crianças, idosos, jovens e até entre eles mesmos dessa Globolixo!!! Ainda dá tempo para reverter isso tudo é banir essa desgraça que virou esse canal assassino e irresponsável! Vamos começar a ensinar em casa nossas crianças…pois são nossas que ficam aqui neste atoleiro e as deles mandam para fora do país….o resto que se dane!!! Fora Globo, Michel Temer, Rodrigo Maia e Gilmar Mendes!!! Arquitetos do calabouço!!!!!

Gustavo Horta

23/02/2018 - 13h55

ALGUÉM, EM UMA ANEDOTA, DISSE QUE NO BRASIL A LEI É IGUAL PARA TODOS. NÃO ACHO GRAÇA NENHUMA.
> https://gustavohorta.wordpress.com/2018/02/09/alguem-em-uma-anedota-disse-que-no-brasil-a-lei-e-igual-para-todos-nao-acho-graca-nenhuma/

ALGUÉM, EM UMA ANEDOTA (pode ter sido em uma pérola da filmoteca nacional), DISSE QUE NO BRASIL A LEI É IGUAL PARA TODOS. NÃO ACHO GRAÇA NENHUMA….

Geovane

23/02/2018 - 12h48

O melhor momento que o Brasil já teve, foi regime diferenciado de 1964 a 1984. Saudades!

    Elaina Barboza

    24/02/2018 - 07h51

    Concordo, pois essa democracia de que tanto falam, deveria se chamar Endemoniocracia!

    Marcello Dias

    24/02/2018 - 09h41

    Perfeito, parabéns Presidente Michel Temer, a população do RJ, inclusive das comunidades agradece a intervenção federal do Exército. Bela iniciativa que deveria espalhar por todo o Brasil.

    Avani Freitas

    24/02/2018 - 10h09

    Não vivi esse periodo…mas pelo visto as pessoas de bem viviam em paz e não tinham o que temer…

      Miguel do Rosário

      24/02/2018 - 13h57

      Na ditadura, havia assalto até de marmita de trabalhador. A criminalidade brasileira explodiu – e se consolidou como uma das maiores do mundo – na ditadura militar. Antes da ditadura é que havia paz e tranquilidade nas cidades.


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